Política em Três Tempos - Por Paulo Queiroz

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Foto: Divulgação

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1 – VENDILHÕES DA AMAZÔNIA De pouco ou quase nada adiantou o esforço das autoridades diplomáticas e ambientais do Brasil - as ministras Dilma Roussef (Casa Civil) e Marina Silva (Meio Ambiente) à frente – no sentido de que fosse amplamente divulgado no exterior o fato de que a taxa de desmatamento da Amazônia em 2006 caíra 25,3% em relação ao ano anterior. A divulgação por aqui foi feita no início do mês e repercutida por toda comunidade científica ligada ao setor, aí incluído, entre vários, o presidente do Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (Inpe), Gilberto Câmara, que chegou a comemorar lembrando ter sido esta a segunda redução consecutiva. "Isso mostra que antes havia uma tendência de crescimento e que agora está caindo significativamente", comentou. Não obstante as chancelarias brasileiras espalhadas pelo mundo afora terem feito das tripas coração para repercutir o anúncio, principalmente na Europa e nos EUA, a mídia internacional acabou dispensando o grosso das suas atenções à outra notícia, igualmente sobre a Amazônia, só que com o sinal trocado. É o tal caso. Os editores de língua inglesa costumam repetir como baliza da mídia de seus países: “No bad, no news”. Ou seja, algo como “se não é ruim, não é notícia”. Pois bem. O relato pelo qual a imprensa internacional se encantou decorreu de levantamento realizado pelo pessoal do Greenpeace no Pará, resultando em uma denúncia segundo a qual o governo do presidente Lula da Silva anda vendendo a Amazônia sob o disfarce de projetos de desenvolvimento. Na reportagem, produzida a partir de Santarém (PA) e assinada pela jornalista Shophie Morris, o próprio presidente Lula da Silva é apontado como responsável pela tramóia motivado por, basicamente, dois propósitos: tentar cumprir aos trancos e barrancos a promessa “irrealista” de assentar 400 mil famílias de sem-terras no primeiro mandato e, depois, mas não menos importante, arrecadar dinheiro para a reeleição mediante o favorecimento às grandes madeireiras que operam na região. Na síntese, o governo foi acusado de vender grandes porções da floresta a empresas madeireiras inescrupulosas, sob o disfarce de um plano ineficiente de desenvolvimento sustentável. Tão ou mais presente no mundo do que a diplomacia tupiniquim, o Greenpeace infestou as redações de tudo quanto é lugar neste planeta com o texto embaraçoso. Até nestes cafundós a maracutaia já andou repercutindo, por intermédio da edição do dia 21 passado da coluna “Resenha Política”, do jornalista Robson Oliveira, em notas apontando como fonte o jornalista Clóvis Rossi (“Folha de S. Paulo”). Enfim, numa tradução capturada na Internet do que foi publicado pelo “Financial Times”, de Londres, seguem-se os principais trechos da denúncia. 2 – GATO POR LEBRE “Luiz Inácio Lula da Silva chegou à presidência em 2003 com a promessa de assentar 400 mil famílias de sem terras em quatro anos, meta tão pouco realista que ele é acusado de só ter conseguido realizar uma parte, mesmo assim por meio de acordos de último minuto antes de sua reeleição. Uma investigação de oito meses sobre a trapaça de terras, conduzida pelo Greenpeace, revelou que a agência brasileira de reforma agrária, Incra, estabeleceu grandes assentamentos em áreas florestais, em lugar de posicioná-los em áreas já desmatadas, e os povoou com famílias urbanas que imediatamente venderam os direitos de exploração madeireira às grandes empresas do setor.” “Em 2006, o Incra criou 97 ‘Projetos de Desenvolvimento Sustentável’ (PDS) em Santarém, na região oeste do Pará, em áreas de floresta primária muito procuradas pelas madeireiras. Os assentamentos ocupam uma área de 2,2 milhões de hectares, e 33,7 mil famílias foram designadas para ocupá-los. ‘Todos esses assentamentos foram criados nos três últimos meses do ano passado’, diz um funcionário do Incra. ‘Era o final do primeiro mandato de Lula, de modo que ele tinha de realizar as metas. Foram os políticos que se beneficiaram do sistema PDS’. Em outubro de 2006, Lula conseguiu a reeleição.” “Além dos políticos, o esquema beneficia os colonos, que recebem terras e vendem os direitos de exploração florestal a grandes madeireiras, as quais ganham acesso a recursos preciosos, e o Incra, que estás perto de atingir as metas estipuladas pelo governo. Ainda na semana passada o governo brasileiro estava se vangloriando de uma queda no nível de desflorestamento pelo 3º ano consecutivo, mas agora abriu as portas ao desflorestamento ainda mais intenso, com as conseqüências adversas que isso acarreta no clima mundial. O Brasil é o 4º maior emissor mundial dos gases responsáveis pelo efeito-estufa. Uma grande proporção das emissões deriva do desflorestamento da Amazônia e 15,5% deste é gerado pela criação de assentamentos.” “O Incra está criando assentamentos com tamanha rapidez que não consegue fornecer a infra-estrutura necessária aos colonos. Por isso, a agência improvisa encorajando as associações de moradores a fecharem acordos com madeireiras, que constroem estradas e saneamento em troca dos direitos de exploração florestal nessas áreas. O conceito do PDS foi concebido em 1999 por Raimundo Lima, diretor do Incra, como forma de sustentar as famílias que seguem um modo de vida tradicional, de forma a permitir que vivessem da terra.” “Cada família deveria receber alojamento e um certo montante de crédito financeiro que lhes desse a oportunidade de começar a plantar; elas teriam permissão de cultivar 20% das terras que lhes seriam destinadas, e explorar a madeira dos 80% restantes, de acordo com um plano rígido de gestão de recursos florestais. Agora, esses planos são ditados pelas madeireiras, o que significa que elas podem violar as normas de desenvolvimento sustentável e pagar valor bem inferior ao de mercado pela madeira extraída.” 3 – FLORESTAS CAÍDAS “Felipe Fritz Braga, procurador da Justiça Federal brasileira em Santarém, diz que a forma original do PDS como assentamento para famílias que seguiam o modo de vida tradicional da região foi abandonado, e que as madeireiras bancaram as eleições do ano passado para salvaguardar o programa. ‘Dez anos atrás, foram criados diversos PDS que deveriam servir a preservar comunidades tradicionais. Com o passar do tempo, eles sofreram uma metamorfose jurídica e agora estão sendo usados na Amazônia a fim de assentar pessoas que não formam comunidades tradicionais’, explica Braga. ‘A fonte de verbas de campanha para o governo, nas eleições, foram as madeireiras’. No escritório do Incra em Santarém, que quadruplicou de tamanho em 2005, antecipando a atual onda colonizatória, os funcionários estão insatisfeitos com os métodos que foram encorajados a seguir a fim de obter aprovação a tantos assentamos em prazo tão curto.” “Dois informantes alegam que foram forçados a falsificar as datas de importantes documentos, que viram em computadores da instituição mapas que um funcionário do Incra desenhou para um grileiro de terras e que a pesquisa para a criação de um PDS foi realizada com o uso do avião de um próspero empresário madeireiro. Eles também alegam que 11 assentamentos foram criados no Parque Nacional da Amazônia, onde não há quaisquer famílias assentadas, a pedido de um poderoso fazendeiro, e estão preocupados com a possibilidade de que a situação em torno de Santarém sirva como indicação de maior devastação na Amazônia. ‘Acreditamos que o que está acontecendo seja um teste de laboratório e que o modelo venha a ser reproduzido posteriormente no restante da Amazônia’, afirmaram.” “O Incra não discute oficialmente um assentamento chamado Renascer, criado no território disputado entre duas madeireiras, a Alecrim e a José Pires. O assentamento deveria abrigar 200 famílias, mas em lugar disso os direitos sobre a terra estão sendo disputados pelos presidentes de duas associações rivais de moradores, cada uma das quais apoiada por uma madeireira. Comandar esse tipo de associação é uma atividade em crescimento entre os empresários locais. Sancler Oliveira está negociando os direitos de exploração florestal em nome do seu quinto grupo de famílias.” “Um assentamento chamado Santa Clara foi criado em outra área já controlada por madeireiras. Francisco das Chagas Dias recebeu terras no local em companhia de 26 outras famílias de colonos depois que foram ordenados pelo Incra a sair de outro assentamento por se recusaram a acatar as ordens da madeireira que dirigia a área. Eles recusaram a transferência para Santa Clara, e estão de novo à espera de assentamento em alguma outra região. Em Igarapé do Anta, o PDS modelo do Incra, a maioria dos residentes deixou suas casas novas para trás e encontrou empregos na cidade. ‘Eles as usam como casas de fim de semana’, disse Antonio Rodriguez dos Santos, ex-presidente da associação de moradores de Igarapé do Anta.” “A Amazônia há muito está sob ameaça de grandes empresas; as madeireiras desbastam a floresta densa antes que os fazendeiros se instalem nas terras para criar gado, criar imensas plantações de sojas, e exaurir o solo. Passada quase uma década de sua concepção institucional, o sistema PDS se transformou em um catalisador que permite à indústria madeireira abocanhar parcela ainda maior dos recursos naturais da Amazônia.” E por aí vai o texto do Greenpeace.
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