Corrupção corporativa - Por Andrey Cavalcante

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Foto: Divulgação

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 “Quando o governante se afasta da justiça, os governados se afastam da obediência”. O vaticínio do provérbio árabe ajusta-se à perfeição ao conturbado momento político/institucional brasileiro. A indignação nacional contra a corrupção começa a se fazer acompanhar por um sentimento que mistura surpresa, estarrecimento e desencanto, pela constatação de que todos são efetivamente contra essa verdadeira endemia nacional, desde que a prática criminosa seja atribuída aos outros, ou no endereço em frente. Ou seja: aquela dosagem de corrupção corporativa, da qual se beneficiam determinados grupos de privilegiados não deve ser considerada.

Percebe-se, claramente, para inquietação geral, que se a lei é igual para todos, alguns insistem em considerar-se mais iguais que os outros, com disse Orwell. “O brasileiro é bom. O brasileiro é honesto. Senão, este país estaria imerso no caos social” – sentencia o ensaísta Mario Cesar Pacheco, que assina o blog “Perspectiva crítica”, ao refletir sobre a história, que circula na internet, que estabelece uma comparação entre suecos e brasileiros e sentencia que os primeiros são civilizados e nós, os outros, não.

- O assunto surgiu – escreve Pacheco – com uma história por Décio Tadeu Orlandi, que se intitula bacharel em Letras pela USP e mestre em Literatura pela UFG. Ele diz que “Há alguns anos, entrei numa estação de metrô em Estocolmo, a tão civilizada capital da tão primeiro-mundista Suécia, e notei que havia entre muitas catracas comuns uma de passagem livre. Questionei a vendedora de bilhetes o porquê daquela catraca permanentemente liberada, sem nenhum segurança por perto, e ela me explicou que era destinada às pessoas que por qualquer motivo não tivessem dinheiro para a passagem. Minha mente incrédula e cheia de jeitinhos brasileiros não conteve a pergunta óbvia (para nós!): e se a pessoa tiver dinheiro mas simplesmente quiser burlar a lei? Aqueles olhos suecos e azuis se espremeram num sorriso de pureza constrangedora – Mas por que ela faria isso? – perguntou. Não respondi. Comprei o bilhete, passei pela catraca e atrás de mim uma multidão que também havia pago por seus bilhetes. A catraca livre continuava vazia, tão vazia quanto minha envergonhada alma brasileira”.

O episódio ilustra a defesa que o autor faz da ação do estado, que torna os países nórdicos os primeiros em IDH no mundo e permite tamanha exibição de comportamento civilizado. Ele sentencia que a repetição cotidiana do respeito que o Estado tem pelo cidadão alimenta o respeito que o cidadão tem pela coletividade numa espiral sócio-cultural-institucional que a policial sueca nem mesmo consegue imaginar o porquê de alguém violar uma regra social e ética como a de somente passar pela roleta gratuita se não tiver dinheiro. Mostra também o que devemos fazer para chegar lá: “investimento em educação e no serviço público eficiente, para que os cidadãos, obtendo respeito de seu Estado (e não falta de Estado como querem alguns), possam alimentar carinho, consideração, amor e respeito por suas instituições e pelo bem coletivo e suas regras de conduta”.

Episódios recentes de nosso cotidiano indicam estarmos muito longe do caminho certo. E a cada dia nos afastamos mais. No atual ambiente de obnubilamento das consciências e exacerbação das vontades, a culpa é sempre dos outros – advertiu no domingo o editoria de O Estado/SP.

Exemplos disso têm sido repetida e lamentavelmente registradas justamente por aqueles aos quais confiamos nossas mais acalentadas esperanças de uma reversão consistente de todas mazelas que afastam o país dos rumos desejados. Foi esse o caso do ministro Luiz Fux, que determinou, em uma liminar monocrática, a anulação de todos os procedimentos legislativos relacionados com as Dez medidas contra a corrupção, remetendo tudo de volta à estaca zero. A medida – cuja impropriedade parece consensual entre seus pares – contraria “as mais elementares noções de separação de poderes, de coisa julgada, de obediência a precedentes, enfim, tudo aquilo que forma o arcabouço a que chamamos de segurança jurídica e que tem sido desconstruído pelo Judiciário não se sabe exatamente a troco de quê” – conforme observa Ibaneis Rocha, secretário-geral adjunto do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Para ele, “é emblemático do quadro de perplexidade atual. O Supremo corrigir eventuais aberrações legislativas, mas jamais interferir durante o processo em que elas estão sendo gestadas dentro do parlamento. Nos últimos tempos, porém – tempos estranhos, como se tornou recorrente afirmar – nada se pode garantir à luz de decisões que põem a hermenêutica de ponta-cabeça. Em se tratando do Supremo, então, tudo se tornou possível, ou, melhor, imprevisível, pondo os poderes em franca rota de colisão.

- Vivemos uma crise econômica das mais graves. Há uma série de propostas em discussão, muitas delas polêmicas, mas uma coisa é certa: é necessário erradicar as castas que dividem os cidadãos entre aqueles que têm toda a sorte de privilégio estatal e aqueles que ficam jogados à própria sorte, que acabam tomados por completa desesperança. O resultado dessa desesperança é sentido nas urnas, na rejeição à política, que nunca levou nenhum país a algum bom lugar. Temos de retomar as rédeas do país e começar a respeitar as regras. Tudo o que se espera do Judiciário é que ele funcione como garantidor da liberdade ativa e da Constituição. Sempre que esse equilíbrio esteve ameaçado, escancararam-se as portas para os oportunistas.

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