Política em Três Tempos - Por Paulo Queiroz

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Foto: Divulgação

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1 – TRÊMULOS TRÓPICOS Consultor das Nações Unidas para o Desenvolvimento da Amazônia, o professor Armando Dias Mendes, da Universidade Federal do Pará (UFPA), teria colhido em Porto Velho, neste final de semana que passou, mais um exemplo para lá de flagrante com que comprovar um recorte do seu pensamento exposto há tempos numa conferência intitulada “Três Teses Travessas Sobre os Trêmulos Trópicos” – no caso, o trópico úmido brasileiro, grosso modo correspondendo à Amazônia ou Região Norte. A evidência de que se fala como ilustração das teses do professor Dias Mendes diz respeito à operação deflagrada pela 17ª Brigada de Infantaria de Selva com a finalidade de, conforme disse em entrevista o General-de-Brigada Luiz Alberto Martins Bringel, comandante da unidade, “evitar a consumação da invasão” de área em frente ao Tribunal de Contas reclamada pelo Exército. De acordo com o professor Dias Mendes, para as autoridades do governo brasileiro, o Brasil é o Centro-Sul, o resto é o resto - uma extensão, afortunadamente contígua. Na prática: o Trópico Úmido não existe – e esta é a sua primeira tese. Mas a vastidão amazônica insiste em não desaparecer e, como as coisas precisam ser feitas, então que sejam feitas a partir de decisões tomadas fora, por pessoas de fora, ou por instituições sediadas fora da região. Quando muito, já que algumas instituições são aqui sediadas, que extra-amazônicos as tripulem. Conclusão: não há vida inteligente no Trópico Úmido. Por fim, ainda conforme o acadêmico, circunstâncias de natureza diversa, inclusive de caráter histórico, portanto, por vezes concorrem para o reconhecimento prático, embora relutante, de que a Amazônia, enquanto região geográfica, existe. E que há, aqui, fortes indícios de vida inteligente. Mas sempre permanece uma resistência latente a assegurar a esses seres o exercício real de certos direitos, o uso de sua liberdade de propor. Ou seja, a vida inteligente que há no Trópico Úmido não serve para conduzir os destinos do dito cujo. 2 – ANEDOTÁRIO AMAZÔNICO É quando, lá pelas tantas, Dias Mendes argumenta: “Circunstâncias de momento permitiram, no passado, não obstante, que alguns organismos regionais se instalassem na própria região: Sudam, Suframa, Basa, Inpa, dentre outros. Não tem sido infreqüente que seus dirigentes máximos, ou integrantes de Diretorias e Conselhos, sejam buscados fora, nomeando-se pessoas que conhecem a Amazônia, quando muito, a partir das reportagens glamourizadas de Jacques Cousteau e similares. São verdadeiras intervenções brancas, geradoras de equívocos tragicômicos que enriquecem o anedotário amazônico”. Na coletiva dada à imprensa nesta terça-feira (23) o governador Ivo Cassol (afastado do PPS) foi de uma precisão cirúrgica quando disse algo assim: “Duvido que uma autoridade comprometida com os interesses locais ou preocupada verdadeiramente com Rondônia fosse autorizar uma operação armada contra sua população. Mas o general Bringel não tem nada a ver com Rondônia, fica dois anos e depois vai para outro local, por isso faz o que faz”. Como o próprio Dias Mendes esclarece, não se exige que os dirigentes dos órgãos federais instalados no Trópico Úmido – muito menos de instituições como as Forças Armadas, frisamos nós - sejam, de fato, nativos, mas que, ao menos de vez em quando, se coloquem no lugar destes, procurem enxergar o que se passa ao redor com os olhos do povo, auscultem o clamor do anseio coletivo. Caso o general Bringel ou seu superior imediato, general Heleno Pereira (do Comando Militar da Amazônia) tivessem levado em consideração quaisquer destas preocupações, o Exército Brasileiro não estaria sendo obrigado a pagar esse mico, protagonizando essa papagaiada que vem representando a ocupação da área em que está sendo edificado o teatro estadual por mais de uma centena de fuzileiros armados até os dentes. Saberiam que há mais de uma década a população espera por esse teatro (o primeiro da Capital) e não é agora - quando um administrador garante que vai terminá-lo – que vai desistir dele. 3 – HERÓI CULTURAL O que mais impressiona nesse sarrabulho é a candura com que os comandantes militares explicam, conforme nota oficial, que parte do terreno em que seria edificado o teatro – de resto cedido ao governo em regime de comodato – foi arbitrariamente dividido e parte dele destinado aos negócios - “em fase adiantada de venda ao Ministério Público Federal”, informa a nota. Qualquer mestre de obras sabe que outro edifício ali não apenas desfiguraria, mas inviabilizaria completamente o funcionamento do teatro. Mas, e daí? O que interessa aos comandantes militares é faturar uns cobres para financiar a “construção de casas para subtenentes da guarnição de Porto Velho”, esclarece a nota. Quer dizer, a população interessada no teatro, de cujo bolso já saíram os recursos do esqueleto da obra, que fique a ver as catraias do Madeira. Só não chega a surpreender porquanto destes desatinos da caserna aqui há precedentes. Num deles, quando foi reformar a casa em que ia morar (hoje memorial), o coronel Jorge Teixeira – nomeado governador do Território – encantou-se com as árvores da calçada e, como achasse o jardim exíguo, não pensou duas vezes: mandou avançar o muro açambarcando as árvores encantadoras e botou a calçada no meio da rua. Por vários anos, a casa contígua (por sinal, destinada a militares) ficou com a frente recuada. Depois, mandaram alinhar o muro pela invasão governamental. E a marmota ainda está lá. Chegado a um enfrentamento, o governador Ivo Cassol está adorando. Pudera. Caso a argumentação militar fosse verdadeira – a de que o dirigente teria invadido a área (o que não é o caso, porquanto bem ou mal o governo é que detém a posse do terreno) tornando-se necessário a utilização da força -, ainda assim seria fácil dizer quem deve sair com os louros dessa peleja. Afinal, não é todo dia que aparece alguém disposto a enfrentar o Exército em armas para construir – pasme! – um teatro. Pelo jeitão, a pândega vai longe. Qualquer que seja o resultado, o risco mais sério que se corre é o de ver Cassol ser elevado ao panteão dos heróis da cultura nacional.
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