A Defensoria Pública da União (DPU) ingressou com uma ação civil pública na Justiça Federal contra o deputado federal bolsonarista Bibo Nunes (PL-RS), em razão do vídeo gravado no dia 9 de outubro, no qual o parlamentar ofende estudantes das universidades federais de Santa Maria e Pelotas que protestaram contra bloqueios na educação feitos pelo governo federal. A ação foi protocolada no sábado (22) e tornada pública nesta quarta (26).
O deputado Bibo Nunes afirmou que ainda não foi notificado pela Justiça e irá se manifestar após a comunicação. Ainda assim, confirmou que o vídeo já foi excluído de seus perfis das redes sociais. “Estão no direito deles”, disse.
No pedido, o defensor regional de Direitos Humanos no RS Daniel Mourgues Cogoy solicita que Bibo ofereça resposta ao que foi gravado e retire imediatamente de suas mídias digitais o vídeo, sob pena de multa de R$ 10 mil por dia de atraso. Além disso, pede que ele se abstenha “de fazer referências negativas aos vitimados pelo incêndio da Boate Kiss, especialmente quando associados aos estudantes das universidades federais de Pelotas e Santa Maria” e pague uma “indenização por dano moral coletivo”.
“A ação do réu causou um dano que não se restringe ao patrimônio individual de cada prejudicado. Ela atingiu o âmago da dignidade humana, atentando contra a premissas e objetivos fundantes do Estado Democrático de Direito […]. O dano constatado transcende o interesse dos indivíduos prejudicados e atinge a sociedade como um todo, uma vez que atinge os próprios fundamentos e objetivos da comunidade política brasileira”, sustenta.
A DPU também intima UFPEL e UFSM para que manifestem seu interesse ou não em compor a ação.
“As declarações do demandado, ao pregar que os estudantes sejam vítimas de homicídio por meio violento e cruel – incineração – põe em risco a vida dos discentes e a segurança dos trabalhos desenvolvidos na comunidade estudantil de ambas as instituições de ensino. Ora, é sabido que, em casos semelhantes, as falas de lideranças políticas incitando a violência e inflamando discursos de ódio têm resultado em brigas entre vizinhos, invasões a hospitais e agressões a religiosos”, diz defensor na ação.
O Ministério Público Federal (MPF) instaurou um procedimento para averiguar a manifestação.
Entenda a polêmica
Durante uma transmissão online, Bibo Nunes critica os estudantes por atos em protesto ao presidente Jair Bolsonaro (mesmo partido). A publicação do vídeo é do dia 9 de outubro, mas viralizou na semana passada, depois de uma manifestação de um ex-reitor da UFSM, o professor Paulo Afonso Burmann, que usou um trecho do vídeo para criticá-lo.
No vídeo, Bibo profere ofensas aos alunos, chamando-os de “inúteis”, “alienados”, “vergonha”, “escória do mundo”, “miseráveis” e “parasitas”. Depois, ele faz uma alusão ao filme “Tropa de Elite”, em que estudantes universitários são queimados vivos em pneus. Após a repercussão, no domingo (23), o deputado pediu desculpas pelo vídeo.
“Errar é humano! Depois de uma mãe me relatar as perseguições contra sua filha na universidade, porque era bolsonarista, fiquei muito irritado e fiz um vídeo, onde perdi o controle emocional. Jamais vou querer que alguém seja queimado vivo. Peço desculpas a todos pela insensatez”, escreveu nas redes sociais.
Para o presidente da associação de vítimas da Kiss, em que 242 pessoas morreram em um incêndio na boate, em 2013, “além de desumanizar e desprezar por completo os estudantes da Universidade Federal de Santa Maria, demonstrou total desconsideração pela memória e história da cidade, marcada pela tragédia-crime da boate Kiss”.
“A juventude de Santa Maria é marcada pelas cicatrizes da tragédia e ainda busca formas de viver e lidar com as consequências traumáticas da nossa história. As ofensas à vida proferidas pelo deputado são uma barbárie e ferem a toda humanidade de uma nação. Jamais aceitaremos a naturalização da insanidade, da violência e da desumanidade. Não aceitamos a desculpa de ‘mal entendido’ de quem proferiu as frases que disse, na íntegra, e que faz do uso da palavra sua profissão”, afirmou o presidente da AVTSM, Gabriel Rovadoschi Barros.
“As palavras do deputado, portanto, remetem a tal ocorrido, rememorando e revivendo a dor por tantas perdas. Ao assim se manifestar, o deputado agiu de forma consciente e intencional no sentido de agredir não apenas os estudantes universitários, mas também os familiares e amigos enlutados”, acrescentou o defensor público da União.
Bibo Nunes, de 65 anos, tentou a reeleição para o cargo de deputado federal no pleito deste ano, mas, com 76.521 votos, não conquistou a vaga, ficando como primeiro suplente. Contudo, com o indeferimento do registro da candidatura de Marlon Santos (PL), ele deve assumir o cargo.
Ele foi eleito deputado federal em 2018, via quociente partidário, com 91.664 votos. Em quatro anos de legislatura, teve um projeto aprovado, em 2020.
Em 2016, filiado ao PMDB, se candidatou para vereador em Porto Alegre, mas não se elegeu. Antes, em 2014, já havia tentado se eleger como deputado pelo PSD, e também não foi eleito.