Justiça mantém decisão do TCE que obriga Presidente da Unimed/Rondônia a devolver dinheiro recebido indevidamente dos cofres públicos
O juiz Alexandre Miguel, da 1ª Vara da Fazenda Pública de Porto Velho, julgou improcedente ação anulatória movida por Ida Perea Monteiro, presidente da Unimed em Rondônia, contra o Estado de Rondônia visando anular decisão do Tribunal de Contas do Estado que obriga a médica a restituir aos cofres municipais recursos recebidos indevidamente. O magistrado também condenou Ida Perea a pagar as custas processuais.
Segundo consta do processo, Ida Perea é titular de contratos trabalhistas firmados com o Governo do Estado e com a Prefeitura de porto Velho, no cargo de médica, para trabalhar 40 horas semanais em cada esfera administrativa, totalizando uma carga de 80 horas semanais.
“Ora, é indispensável maiores esforços para se concluir pela impossibilidade humana de se cumprir 80 horas semanais de atividade laboral. Na verdade, a incompatibilidade de horário da recorrente (Ida Perea) representa prejuízo ao erário, pois certamente cumpriu um dos contratos em detrimento do outro”, diz trecho de um documento elaborado pelo Tribunal de Contas e transcrito na sentença do juiz Alexandre Miguel.
Para o magistrado, Ida Perea não conseguiu provar que realmente trabalhou as 80 horas semanais, não fazendo prova da efetiva prestação de serviços que alega ter realizado. Segundo Alexandre Miguel, a excessiva carga horária semanal que Ida Perea alega ter praticado “foge dos padrões normais de coerência e habitualidade”.
“Relembro a máxima de Malatesta a respeito da necessidade da produção de provas, quando salienta que ‘o ordinário se presume, enquanto que o extraordinário há que ser provado’. Neste sentido, possuindo a autora uma carga de trabalho de 80 horas semanais, o que dá em média 16 horas diárias de serviços, ou ainda, um horário corrido equivalente das 8 às 24 horas diárias, fugindo dos padrões normais, haveria ela que fazer a demonstração eficaz e cabal da efetiva prestação de serviços”, anota o juiz em sua decisão.
VEJA A ÍNTEGRA DA DECISÃO
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE RONDÔNIA
1ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE PORTO VELHO
Autos n. 001.2006.025561-6
Fls.
AÇÃO ANULATÓRIA
AA: IDA PEREA MONTEIRO
RR: ESTADO DE RONDÔNIA
Vistos etc.
Ida Perea Monteiro moveu esta Ação Anulatória em face do Estado de Rondônia objetivando anular o Acórdão n. 383/99, do Tribunal de Contas do Estado, que a determinou restituir valores aos cofres municipais. Aduz que foi contratada como médica ao Município de Porto Velho, mas que mesmo tendo prestado seus serviços ao ente público, o Tribunal de Contas, ao analisar a sua contratação, entendeu indevidos os pagamentos efetuados. Diz que a permanecer a hipótese, haverá enriquecimento sem causa por parte do município, mormente porque prestou os serviços e não agiu de má-fé.
Juntou documentos.
Pediu tutela antecipada, que foi indeferida.
Na resposta o Estado afirma, em suma, ‘que a Autoria recebeu de forma indevida a remuneração de um dos cargos que diante da impossibilidade de compatibilizar os horários que teria que cumprir’, com carga semanal de 80 horas.
Houve réplica à contestação e as partes não manifestaram interesse na produção de provas, razão pela qual antecipo o julgamento da lide.
Isso posto, decido.
Tenho que a pretensão não merece acolhimento. De início cumpre registrar que a autora não ataca os aspectos formais da decisão do Tribunal de Contas. Alude, apenas, que não poderia ser imposta a ela a obrigação de restituir a remuneração, porquanto efetivamente prestou os serviços ao Município.
Lendo a decisão da Corte de Contas, num primeiro momento verifica-se que se decidiu apenas e tão-somente no aspecto da incompatibilidade de horários.
Com efeito, restou consignado naquela decisão: “As exceções abordadas não são aplicáveis aos casos específicos deste processo, estando desta forma irregular os pagamentos de remunerações que constituem acumulações remuneradas de cargos, no caso, as remunerações provenientes do segundo cargo em que o servidor foi admitido” (sic., fl. 31, último parágrafo).
Vale dizer, que a Corte de Contas, só pelo fato da acumulação ser indevida condicionou a restituição do que recebido. Não se analisou – naquela ocasião – se efetivamente houve a devida e correspondente prestação dos serviços. A análise da Corte de Contas foi aparente e meramente formal.
Impondo a lei maior a impossibilidade de acumulação, determinou a restituição do segundo cargo, tendo como indevido o objeto contratual.
Entretanto, num momento posterior analisou a existência ou prova da prestação dos serviços, quando a autora interpôs perante aquele colegiado Pedido de Reconsideração, que restou desprovido, acolhendo-se a seguinte razão de decidir: Conforme se depreende dos autos, a ora recorrente é titular de contrato trabalhista firmado com o Governo do Estado e com a Prefeitura Municipal de Porto Velho, no cargo de médica, para laborar 40 horas semanais em cada esfera administrativa, totalizando uma carga horários de trabalho de 80 horas semanais, conforme quadro demonstrativo às fls. 2022 do Processo 3209/96).
Ora, é dispensável maiores esforços para se concluir pela impossibilidade humana de se cumprir 80 horas semanais de atividade laboral. Na verdade, a incompatibilidade de horário da recorrente demonstra prejuízo ao erário, pois certamente cumpriu um dos contratos em detrimento do outro, motivo pelo qual não há que se falar em enriquecimento ilícito pelo Município com a possível devolução dos valores percebidos indevidamente.
Além disso, o recurso interposto não comprova que a recorrente teria realmente conseguido, de alguma forma, cumprir satisfatoriamente às 80 horas de trabalho semanais. (sic., fl. 52) - grifei Note-se, pois, que a autora, tanto lá como cá, não fez prova da efetiva prestação de serviços que alega ter realizado.
Relembro a máxima de Malatesta a respeito da necessidade da produção de provas, quando salienta que “o ordinário se presume, enquanto que o extraordinário há que se provado”. Neste sentido, possuindo a autora uma carga de trabalho de 80 horas semanais, o que dá em média 16 horas diárias de serviços, ou ainda, um horário corrido equivalente das 8 às 24 horas diária, fugindo dos padrões normais, haveria ela que fazer a demonstração eficaz e cabal da efetiva prestação de serviços. Com efeito, a lei já impõs a impossibilidade de acumulação, salvo se houver a compatibilidade de horários, justamente porque presume que em casos tais (dependendo da carga horária), não haverá condições de haver sobreposição de horas trabalhadas.
Assim, essa condição – falta de prova da efetiva prestação de serviços – retira, inegavelmente, ao menos em termos processuais formais, a alegada boa fé da autora para fazer jus ao acolhimento de sua pretensão.
Não se negue que a autora possa ter prestado seus serviços e cumprido com rigor o objeto do contrato que possuía. Anote-se, entretanto, que não há prova de que tenha assim agido, prova essa que lhe competia formular, diante da excessiva carga horária semanal praticada, que foge dos padrões normais de coerência e habitualidade.
Saliento por fim que essa prova haveria de ser feita por documentos, já que a prova testemunhal serviria, quando muito, para atestar apenas um certo e determinado período de labor e não todo prazo do contrato.
Do exposto, julgo improcedente o pedido inicial e condeno a autora nos encargos da sucumbência, arbitrando em R$ 500,00, atento ao mediano grau de complexidade da causa e à antecipação do julgamento. Custas de lei.
PRI.
Porto Velho, 12 de maio de 2008.
Juiz Alexandre Miguel