Vou contar esta história que aconteceu no interior de Minas no ano de 1996, pra demonstrar que é possível três seres se relacionarem, quando presentes o amor, o carinho e a solidariedade.
Foto: Divulgação
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Que tipo de relação pode existir entre um advogado, um burro e um ser humano maravilhoso chamado Abel?
Vou contar esta história que aconteceu no interior de Minas no ano de 1996, pra demonstrar que é possível três seres se relacionarem, quando presentes o amor, o carinho e a solidariedade.
Em dezembro de 1996, fui com meus três filhos e minha esposa de férias a cidade de Capitão Andrade-MG, antigo distrito de Cafezinho, para visitar parentes e amigos.
Certo dia, na parte da tarde, com aquele sol escaldante, sai com meu Golf vermelho para passear na cidade, quando ao passar pela Rua da Palhada, vi um sujeito, negrinho, sentado numa pedra, cabisbaixo, na sombra de um bambuzeiro.
Parei o carro e reconheci. É o Abel! Desci!
E quem é esse cara? – Meu ídolo de infância. Um dos maiores zagueiros da região, colegas de Manoel Miranda, Garrote, Nelinho, Tadeu, todos do Cruzeiro Esporte Clube. Um negrinho já com seus 56 anos, que muita alegria deu aquela comunidade, com seus dribles desconcertantes. Craque nato. Pessoa simples e de grande coração.
Após um abraço, perguntei: - Como vai a vida Abel? Me respondeu: - A vida aqui está muito difícil! Não tem emprego! Era muito feliz naquele tempo de jogador, hoje sou esquecido, pobre, sem trabalho. Hoje tomo conta de uma neta e não tenho nada para comer em minha casa. Não tenho trabalho!
Isso me cortou o coração.
E Abel me disse ainda: - Tenho um sonho! Possuir uma carroça de burro! Pois assim poderia puxar areia, tijolo e com isso daria mais conforto à minha família e não passaria o sofrimento que estou passando hoje.
Esse sonho ecoou forte em minha alma! Naquele momento tirei uma nota de cinquenta reais da carteira e entreguei a Abel. – Vai fazer uma compra para sua casa. Ele chorou. Eu também. Abraçamos, entrei no carro e segui viagem.
Chegando na casa do Quinca Sales, meu cunhado, falei: - Quinca me encontre uma carroça de burro, quero comprar! – Pra quê, indagou! – Vou presentear um amigo. Minha alma pede isso e narrei o que acabara de ocorrer.
Dois dias após, depois de visitar os Vieiras em Itanhomi-MG, retornei a Rondônia para assumir meus trabalhos como advogado na capital Porto Velho.
Uma semana depois, Quinca Sales me liga dizendo: - Achei uma carroça semi nova, com 3 meses de uso, com um burro de aproximadamente 6 anos de idade. Tudo por R$ 3.500,00 (três mil e quinhentos reais).
Pode Fechar. Mandei o dinheiro no dia seguinte.
No final daquela semana Quinca Sales chega na casa de Abel com a carroça e o burro todo equipado. – Abel, isso é seu! Sem entender direito o que tava ocorrendo disse: - Quinca que brincadeira é essa! Que tá acontecendo?
É um presente do seu amigo Romilton Marinho! Quis realizar o sonho que revelou a ele! Sentimentos de emoção, lágrimas, agradecimentos, brotaram dos olhos de Abel. Chamou os vizinhos e começou a contar para todo mundo que tinha ganhado aquele presente. Foi para a praça central da cidade para mostrar a carroça e o burro que tinha ganhado. De lá me ligou emocionado, chorando, agradecendo pelo presente.
Com esse fato público, Abel começou a puxar areia, tijolos e passou a ser o melhor carroceiro da cidade, que mais tinha serviço, não tinha descanso. A procura era maior que a oferta. E o ganho passou a ser significativo. Tinha agenda para 2 a 3 meses depois.
Passados dois anos desse fato, Abel me liga de um telefone público que possui em frente a sua residência, me dizendo que depois daquele fato, nunca mais passou necessidade, que sua vida tinha mudado, que comia do bem e do melhor e me agradeceu mais uma vez. Aproveitei a oportunidade e lhe disse que: - Se o burro morrer, lhe dou outro!
Três anos após esse telefonema, retornei de férias ao meu cafezinho, hoje Capitão Andrade-MG. Fui conhecer a carroça e o burro. Abel fez questão, que eu e meus filhos, andássemos na carroça. Fiz isso e tiramos fotos, para registrar a satisfação desse encontro.
Passados mais alguns anos, da entrega da carroça, Abel me liga dizendo que o burro morreu! Retruquei: - Procure outro que te mando o dinheiro. E assim fiz.
E por ocasião do período da Páscoa de 2008, comprei esse outro burro, mais lhe fiz um pedido. – Quero que esse burro se chame Pascoal! Em homenagem ao período pascal, o que foi prontamente aceito por Abel.
No ano de 2015, Abel me liga, dizendo que iria se aposentar, uma vez que sua saúde não lhe permitia mais trabalhar e que iria passar a carroça para seu genro, o que concordei de imediato. E mais uma vez me agradeceu e cobrou por uma nova visita ao meu querido cafezinho, dizendo estar com saudades.
No inicio deste ano, 2017, voltei ao cafezinho, Capitão Andrade e fui à casa de Abel. Lá chegando aquele abraço gostoso e logo pediu sua Esposa, dona Rute para coar aquele cafezinho, o que foi acompanhado pelos bolinhos (tipo sonho) e me falou de sua saúde, me mostrou a mesa que tinha comprado para sua casa e muito contente com minha visita, registrando que era seu amigo de verdade, já que jamais deixei de ir à sua casa, quandovisitava minha cidade natal.
Quando já estava de saída, Abel me disse: - Romilton sei que não vou viver muito, mas jamais esquecerei o que fez por mim e por minha família. E após me dar um abraço, lhe falei: - Abel, a nossa amizade é divina, que continue mesmo quando um de nós tiver partido. Mas, se eu for primeiro, vou lhe garantir uma vaga em meu quarto lá no céu, o que logo retrucou: - Da mesma forma, e com lençóis brancos, da cor da paz! E assim concluo essa pequena história, para dizer que entre um advogado, um burro e um ser maravilhoso chamado Abel, pode haver histórias que no céu certamente, um dia, iremos lembrar.
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