O livro da Darkside intitulado apenas “BTK”, lançado 2019 e escrito pelos jornalistas Roy Wenzl, Tim Potter, L. Kelly e Hurst Laviana, contém uma das narrativas jornalísticas mais assombrosas a respeito de um assassino em série que estava acima de qualquer suspeita. Dennis Lynn Rader, ou simplesmente BTK, um apelido que ele gostava de se identificar e que em inglês significa “Bind, Torture, Kill”, ou em tradução aproximada: “Amarrar, Torturar, Matar”.
Dennis havia sido escoteiro, depois assumiu a liderança dos escoteiros mirins do estado do Kansas, nos EUA, e era um membro ativo e respeitado da Igreja Luterana de Cristo, assumindo a presidência do conselho de sua congregação.
O também chamado “Estrangulador BTK” matou cerca de 10 pessoas entre 1974 e 1991, a maioria mulheres, nas cidades americanas de Wichita e Park City, que ficam no Estado do Kansas (EUA).
O livro apresenta a versão dos fatos com base nas anotações do jornalistas que cobriram desde o primeiro assassinato cometido por ele em 1974 – com o massacre da família Otero - através do matutino impresso “Wichita Eagle”, que tinha um corpo de profissionais na redação dedicados e especializados em coberturas policiais, até quando o assassino parou com as mortes em 1991, deixando a polícia totalmente desnorteada e sem descobrir a sua identidade.
A condução narrativa de “BTK” é detalhada nas ações do assassino porque quando foi levado a julgamento, depois de capturado, Dennis contou com pormenores cada um dos crimes que cometeu. Além dele matar as vítimas por estrangulamento com as mulheres ele praticava necrofilia e pegavas as roupas íntimas delas, como uma satisfação sexual doentia que o levava a praticar asfixia autoerótica e vestindo roupas de mulher.
Em seus momentos de êxtase sexual, se masturbava usando uma máscara com feições femininas se pendurando em pulias com amarras nos braços e pescoço, quando simulava ele ser a vítima. Para piorar, algumas dessas ocasiões ele tirava fotos dele mesmo com uso de máquinas fotográficas programadas para disparar com temporizador. Após reveladas ele usava essas fotos para se masturbar.
Dennis era essa pessoa doentia enquanto vivia uma vida familiar normal, considerado um pai exemplar, membro da comunidade ativo em prestar ajuda à todos. Ex militar, trabalhava em uma empresa especializada em alarmes no período dos crimes. Quando ele parou de matar, em 1991, decidiu entrar em um período que ele chamou de “sabático”, quando foi se dedicar a criar os filhos – dois, sendo uma filha, Kerri Rawson, o seu xodó. Se tornou então presidente do conselho de sua congregação e era um modelo de homem de família, conservador.
Pela sua vida discreta e a maneira como agiu na execução dos crimes, Dennis tinha um modus operandi peculiar, stalkeando suas possíveis vítimas, observando e mesmo cometendo voyeurismo.
Ele fixava uma vítima provável, mulher, escolhida de forma aleatória, a seguia, depois invadia à sua casa quando não estava e aguardava a chegada. Ele cortava antes a linha telefônica e levava uma sacola com o material que usava para praticar os assassinatos, geralmente cordas, fitas adesivas, máscara e cordão de persianas. As torturava apertando o pescoço até desmaiar, depois as acordava e repetia o processo até matar. Então roubava o vestuário, como calcinhas ou vestidos.
Em 2004, passados 13 anos desde o último assassinato, sem solução, a polícia não conseguiu nenhuma pista do responsável, nada. Foi considerado um “arquivo morto” pela polícia, ou seja, sem solução. Deixado de lado. Nesse período a imprensa, através do jornal Wichita Eagle fez uma ampla matéria sobre os assassinatos de BTK, ressaltando o trigésimo aniversário do primeiro crime do assassino. Com os policiais entrevistados comentando quem nem lembravam mais com clareza dos crimes. Para Dennis isso soou como uma provocação.
O que ele fez? Queria reconhecimento pelo trabalho que fez enquanto atuava como BTK mas sem se entregar, como na época dos crimes, voltou a escrever cartas falando em mensagens cifradas para as TVs e jornais locais se identificando pela sigla que o fez famoso. Até 2005, quando foi finalmente preso, o homem de família e cidadão de bem, enviou 11 comunicações enviando detalhes dos crimes que havia cometido, anexando objetos de suas vítimas, seja uma roupa íntima ou foto.
Isso fez com que a polícia reabrisse o caso e BTK voltou à mídia, sendo citado em vária matérias jornalísticas e preenchendo a sua vaidade.
No livro “BTK”, os jornalistas contam com detalhes que o excesso de confiança de Dennis Rader como um membro da comunidade acima de qualquer suspeita o levou a cometer um único erro na sua trajetória de emissário de novas mensagens. Um ano depois, em 2005, desde o seu retorno, o assassino em uma série de comunicação com a polícia através das cartas
Na sua mente doente, ele passou mandar “souvenirs” de suas vítimas que ele havia guardado, através de caixas de cereais que eram colocadas em pontos estratégicos da cidade. Em uma dessas entregas, em janeiro de 2005, ele deixou essa caixa no banco de uma caminhonete em frente ao estacionamento de uma loja. Só que o dono do veículo descartou o objeto jogando-o na lixeira. Em uma carta à polícia ele perguntou se encontraram a caixa, com a resposta negativa os agentes tiveram que revirar os lixos, para tentar saber que onde estava, tiveram que assistir a fita de vigilância de uma câmera de segurança em frente à loja onde foi deixada. Na imagem, os policiais perceberam que ao fundo do local, tinha uma figura distante que estava dirigindo um Jeep Cherokee, de cor preta e largou o pacote na caminhonete.
Era uma pista vaga, pois o veículo daquele modelo Jeep tinha dezenas na cidade.
O grande vacilo de Dennis Rader foi quando ele enviou um disquete de cor roxa 1.44 Megabyte da Memorex, a rede de TV local, a KSAS-TV, de Wichita. Junto com o disquete estava um colar dourado e um livro sobre um assassino em série.
Através do disquete, um especialista em informática identificou a origem do texto que estava nele, simplesmente acessando o metadados que fica incorporado no documento do Word. Na identificação tinha “Christ Lutheran Church”, sim, o arquivo foi escrito e salvo na Igreja Luterana da cidade e quem o modificou pela última vez foi um tal de “Dennis”, o nome dele estava no registro. Com essa informação os policiais numa pesquisa na internet descobriram que havia um “Dennis Rader”, presidente então dessa igreja.
Com o endereço em mãos, foram fazer uma visita ao principal membro da igreja, pois os policiais não encontraram nada que denotava a conduta de Dennis, sem ocorrência ou mesmo indicação de que fosse alguém problemático, pelo contrário. Incrédulos quando chegaram na casa dele, encontraram a sua esposa e filha, que disseram que ele estava na rua. Porém, na garagem, lá estava o Jeep Cherokee preto. Muita coincidência? Não.
Depois de uma operação policial massiva que reuniu até mesmo os policias que investigaram há 30 anos as primeiras vítimas de BTK, o assassino foi preso, e para choque de todos e, principalmente da família, Dennis Rader confessou seus crimes, se declarando culpado. Ele detalhou todos os homicídios que cometeu e foram encontrados com ele diversas provas, entre elas fotos suas vestindo roupas das vítimas, objetos que usava quando praticava sua lascívia sexual perturbadora.
A ampla cobertura da imprensa em cima do caso causou comoção nos EUA e Dennis acabou condenado a dez sentenças de prisão perpétua pelos homicídios que cometeu. Os seus crimes e a sua incrível história virou filme, motivou dezenas de documentários, livros, sendo esse “BTK”, o melhor e mais completo.
A sua única filha, Kerri Rawson, estava casada e já morava em outra cidade quando soube pela imprensa que o seu pai era um serial killer confesso e, para piorar, o famoso BTK. Ela ficou tão estarrecida, que anos depois publicou um livro que vendeu muito, contando a sua história ao lado do pai, um homem que para ela havia sido um pai exemplar, mas na verdade era um monstro. O livro se chama “A Serial Killer’s Daughter: My Story Of Faith, Love, and Overcoming”, no Brasil foi lançado pela mesma editora Darkside, com um título mais direto “BTK: Meu Pai”.
Na Netflix a série “Mindhunter” – criada e dirigida pelo diretor David Finch (o mesmo de “Seven” e “O Clube da Luta”) -, que mostra como o FBI desenvolveu o seu departamento de comportamento e criação de perfis de serial killer entrevistando assassinos famosos. Na série, principalmente em sua segunda temporada a abertura de cada episódio mostrava uma ação do BTK, dando sinais que a terceira temporada seria focada em sua história. Infelizmente a terceira temporada da série foi cancelada devido ao seu alto custo.
O livro BTK (Darkside/416 páginas – pode ser comprado em preço que variam de R$ 50,00 a R$ 75,00) está disponível à venda ainda, e é uma das leituras mais instigantes já proporcionadas.