O novo Estado, Rondônia, o Eldorado, para o qual houve um fluxo migratório jamais visto. Pessoas de todos os rincões, até artista abandonou novela da Globo e veio para esta terra.
Foto: Divulgação
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Saudações!
Ao ouvir o hino de Jaru, rico em conteúdo, tão bem cantado pela jovem Indianara Cazuza, chego à conclusão de que a emocionante apresentação já era o suficiente para representar a solenidade de inauguração deste tão belo prédio, mas, por participar tão ativamente desta história, não poderia me furtar a rememorar parte tão importante de minha vida profissional e pessoal.
Vivenciamos momentos históricos. Trago na retina e na mente um filme de mais de 3 décadas. Antes, sem fórum; depois, um fórum improvisado na BR (o da grande foto na parede da entrada deste prédio); depois, um fórum de tijolo à vista, muito pequeno (que, costumam dizer, uma caixa de fósforo). Agora, a alegria de inauguração de um prédio para o presente e o futuro, e o mais bonito de nossa Justiça, o da comarca de Jaru.
Nasce uma nova estrela na bandeira brasileira, em plena Amazônia (1981). O novo Estado, Rondônia, o Eldorado, para o qual houve um fluxo migratório jamais visto. Pessoas de todos os rincões, até artista abandonou novela da Globo e veio para esta terra. Sem demora, foi criado o Poder Judiciário (1982) e, concomitantemente, os primeiros concursos da magistratura e do Ministério Público, nos quais concorreram juízes de Brasília e de outros Estados, pois se tratava de um Eldorado.
Fui aprovado em ambos os concursos. Cheguei a ser nomeado promotor (resignatário), mas fui empossado juiz da comarca de Jaru (26/07/82), da qual fui fundador e onde enfrentamos muitos desafios, quase intransponíveis. Logo me dirigi a esta comarca, sem direito de ir a Goiânia para fazer a mudança e trazer a família, que consistia na esposa, grávida da Rafaella, e no primogênito, Roosevelt Júnior, pois o TRE não autorizou meu retorno, com a motivação de que deveria assumir logo a comarca e preparar as eleições que se avizinhavam (15 de novembro).
Assim, logo após a posse lá em Porto Velho, a postos estava o prestimoso Prefeito Raimundo Nonato, de camioneta, para minha condução até esta cidade. Saímos às 17 horas e só chegamos às 5 do dia seguinte. Aqui, irreconhecível de poeira, hospedei-me no antigo Hotel Paraná, de madeira, onde, meses depois, chegou a família, e passou a ser o gabinete. Ali realizei a primeira audiência de conciliação numa separação judicial, tendo como advogado César Trindade.
Só desafios, medidas enérgicas e importantes para, gradativamente, superá-los. Logo passei a treinar os servidores, na sua maioria, requisitados para preparar e realizar o pleito, com pessoas sem experiência cartorária e para as eleições. Havia também que se indicar os cargos de confiança e pessoas para os cartórios extrajudiciais. Não havia alternativa senão resignar-se, prosseguir na jornada, com muita disposição, apoiando, incentivando e acompanhando os servidores de corpo presente na zona rural (façanha que a repetir em Colorado do Oeste, quando em missão especial, preparando e realizando as eleições naquela comarca, 1986), que não mediam esforços para cumprir suas tarefas. Com os abnegados servidores, não agi como chefe (que manda), mas como líder (que vai e faz junto).
Sem mais delongas, permitam-me um registro histórico que a maioria dos presentes desconhece: foi nesta comarca que tudo começou, e houve motivos para isso, chegando, inclusive, a ser modelo para todos os tribunais deste País. Aqui surgiu o embrião da Justiça Itinerante. Isso se deu no âmbito da Justiça Eleitoral, por conta da peculiaridade.
Chamou-me a atenção o fato de estarmos em período chuvoso e de 50% do eleitorado era residente na zona rural. Tal concentração de pessoas nessa área ocorria por conta da reforma agrária, com distribuição de lotes rurais de 50 a 100 hectares, onde o acesso era pelas linhas vicinais. Sobreveio-me grande inquietude, em virtude da dificuldade do alistamento eleitoral manual, pois nem todos teriam condições de vir até a cidade e, tampouco, votar.
Nessas circunstâncias, tudo tendo que fazer às pressas e de forma eficiente, a cartada era abraçar a causa dos servidores (causa da Justiça) e apoiá-los incondicionalmente no trabalho itinerante, o que se efetivou. Porém, se o foco eram as eleições no dia 15 de novembro, com tempo chuvoso e sem tráfego pelas linhas vicinais, como resolver esta outra questão?
Questão emblemática. O Código Eleitoral proíbe a localização de “Seções Eleitorais em fazendas, sítios ou qualquer propriedade rural privada, mesmo existindo no local prédio público, incorrendo o juiz nas penas previstas do art. 312, em caso de infringência”, crime eleitoral e com “pena – detenção até dois anos” ao juiz.
Desobedeci à lei, ao tempo que usei o mesmo Código na parte que diz que o juiz deve facilitar a vida do eleitor, e tudo fiz de forma transparente: baixei atos e portarias, bem como os publiquei para conhecimento dos interessados para eventual recurso. Terminou em reclamação por um dos partidos: recurso que foi ao TRE, e deste subiu ao TSE, em Brasília, que daria a última palavra. Assim foi feito, então se confirmou com acerto a minha decisão. Concluiu-se pela desatualização do Código, pois estava fora da realidade de Rondônia.
Chega o tão esperado dia, 15/11/82, que, para completar a notícia do embrião da Justiça Itinerante, havia eu requisitado do saudoso Governador Teixeirão um helicóptero, no que me atendeu prontamente. Com este veículo, o único para visitar as urnas nas linhas vicinais, lá ia eu para auxiliar e fiscalizar, quando, numa delas, já era 9 horas, não havia nenhum voto colhido, pois não sabiam como começar. Porém, após a minha instrução, a fila andou. Em virtude disso, fui ovacionado na minha saída.
O dia 15 de novembro era também de muita desconfiança, pois a notícia, nos tempos de Território, era de que não havia controle, urnas sumiam, desciam rio abaixo, bem como outras notícias escabrosas. Por isso, reuniões e reuniões, nas quais se exortavam todos os envolvidos nas eleições, especialmente os servidores, a maioria requisitados. Naquele momento, até toco de vela deveria chegar ao local de apuração. Eu dizia, impondo medo e cuidado: “Isso é como uma sentença de morte. Será cumprida, doa a quem doer.”
Graças a Deus, todo o material foi devolvido e todas as urnas entregues no colégio Capitão Sílvio de Farias, onde aguardávamos com lampiões e velas para, no mesmo dia, começar a contagem de votos, que era manual. Porém, ocorreu um incidente lamentável, e tive que suspender a apuração das eleições por quase uma hora, com a providência de intimar os fiscais, delegados e outros que se retiraram da apuração juntamente com o candidato, para retornarem sob pena de prosseguir os trabalhos com ausência dos mesmos.
Do episódio, chegou a notícia ao Presidente do TRE de que o Juiz Eleitoral tinha perdido as rédeas das eleições e que estava hospitalizado. Fui chamado ao telefone, para alívio do Presidente Darci, ao ouvir e constatar que me encontrava à exaustão, mas em plena forma e ânimo de caminhada. Ele teve a certeza de que as coisas estavam sob controle. Obtive seu apoio para que eu “fosse mais duro ainda”.
O fato causou-me indignação, porque tive notícia de que estariam cogitando que eu seria processado, apenas porque estava cumprindo dever de juiz, que na hora certa teve pulso firme e domínio sobre a situação. Respondi que não mudaria uma vírgula da decisão. Descrevi o episódio e na primeira publicação omiti o nome do protagonista da história. O personagem desta chegou a ler e se emocionar, que, com olhos lacrimejantes, disse: “o sr. poderia ter inserido meu nome”. Essa pessoa foi o deputado mais votado na ocasião, Dr. Tomás Correia, que muito contribuiu nesta comarca, como defensor, impetrando o 1º HC, o 1º Mandado de Segurança; o 1º Júri, o qual presidi no cinema de madeira. A história, ora em suspense pode ser lida no Livro: “A Justiça além dos Autos”, editado pela Corregedoria-Geral do CNJ (2016, pag. 442/450): http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2016/08/589e35267a63d9c1d87ef79e56ca5fd2.pdf.
O dito episódio de grande aborrecimento virou história. Eu a contei na ocasião de correição e audiência pública que fiz nesta comarca (2005), quando Corregedor-Geral. Ele estava presente, em solenidade em que os servidores, Dr. Elsi Dalla Riva e demais juízes, todos, carinhosamente, prestaram-me grande e significativa homenagem. Dentre outros atos, a aposição de fotos e documentos da época num quadro fizeram marca indelével no meu ser, o que recordo com saudade e, mais uma vez, agradeço de coração.
Enfim, a idade e o tempo nos dão o direito de ter muitas recordações, mas devo respeitar os presentes e não me prolongar em demasia. Afinal, é tempo de história, e o Judiciário, com os servidores desta Casa e os requisitados, com o indispensável labor do Ministério Público, todos fomos partícipes na consolidação do Estado, fazendo nascer o Legislativo e o Executivo, por meio das eleições. Foi assim que passamos a ter prefeitos nos municípios, senadores, deputados federais, deputados estaduais e vereadores, que formaram a Assembleia Legislativa e as Câmaras de Vereadores, tendo eu, na ocasião, por força de lei, investido na condição de primeiro Presidente da Câmara de Jaru para dar posse à Mesa Diretora, conforme documentado na sua primeira ata.
Seguramente, muito aprendi nesta comarca, da qual trago gratas recordações, pois aqui o povo me recebeu de braços abertos e de forma respeitosa, a começar pelo querido, então prefeito, Raimundo Nonato, promotor Miguel, o titular, depois Dr. Viana, que veio fazer um júri, delegado, também advogados. Um nome que também deve ser lembrado é o do Dr. César Trindade e também os demais segmentos da sociedade. Foi, portanto, aqui a experiência embrionária da Justiça Itinerante e que depois tomou corpo quando estive à frente do antigo Juizado de Pequenas Causas na Capital, numa barraca de lona (1990), e que se tornou modelo neste País, bem como a Justiça Itinerante nos presídios, quando eu estava à frente da Corregedoria, que foi adotada pelo CNJ, com a denominação “Mutirão Carcerário”. Isso é pioneirismo de Rondônia.
Depois da Corregedoria, voltei a esta comarca diversas vezes, como Presidente do TJ (2012/2013), com a engenharia e servidores, empenhado na inauguração deste prédio, sempre com a notícia de que isso ia acontecer naquela gestão. Ledo engano. Tivemos que fazer correções de projetos. Enfim, a burocracia emperrante não nos proporcionou a alegria que só hoje acontece, ainda que com muita espera, valeu à pena. Na certeza de que as gestões anteriores a minha e às que sucederam, todas têm o seu tijolinho assentado na sua edificação. Isso é o que importa. Todos nós nos esmeramos, e muito, para que hoje as placas fossem encravadas (uma da gestão atual e outra prestigiando as administrações anteriores, e o juiz, os colaboradores, para essa inauguração) no Fórum mais aconchegante e mais belo do Poder Judiciário de Rondônia.
Quanta alegria e felicidade para todos nós, magistrados, advogados, membros do Ministério Público, da Defensoria Pública, serventuários da Justiça,
estagiários e, principalmente, a população de Jaru, que aqui comparecerá em busca de solução de suas demandas, pela via da prestação jurisdicional, célere, eficiente, justa e eficaz, para a qual todos nós somos comprometidos a dar o melhor de nós na pacificação social.
É a nossa Casa da Justiça. Registro singular júbilo e realização administrativa ao inaugurarmos este Fórum, pois ele consiste numa obra que representa um marco simbólico de respeito do Tribunal de Justiça pela atividade dos desprendidos operadores do Direito e de nosso apreço pela comunidade de nosso Estado, particularmente do povo jaruense, por quem nutro a maior estima e admiração e que, coincidentemente, tenho a presença viva na comarca, perpetuando-me através do meu próprio sangue, via dos filhos: o primogênito, Roosevelt Queiroz Costa Júnior, promotor de justiça, e a filha, Rafaella Queiroz Del Reis Conversani, que, de Ji-Paraná, atua nesta comarca como procuradora do Estado. Então, tudo é motivo para tanta emoção e regozijo.
Meus agradecimentos, primeiramente, a Deus. À Ele todo louvor, honra e glória. Em segundo, a minha família, especialmente a minha esposa Regina, coluna, mulher sábia, que edifica o seu lar em constantes orações, uma heroína como as esposas dos colegas da época, e à então juíza do meu concurso, desembargadora Ivanira Feitosa Borges, aqui presente. Em quarto lugar, minhas congratulações ao nosso Presidente, desembargador Sansão Saldanha, que, finalmente, consegue inaugurar. Meus parabéns, em especial, a todos os juízes, promotores de justiça, defensoria pública, advogados, serventuários da justiça, estagiários e, principalmente, à população jaruense, que tanto ansiava por este momento.
Escusas por me alongar um pouco, mas foi um pouco do muito que deveria rememorar e agradecer. Que continuemos entusiasmados e cada vez mais comprometidos com a Justiça como exemplo do Brasil. Que Deus nos abençoe!
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