*SELMO VASCONCELLOS - Porto Velho, RO. Poeta, cronista, contista, antologista, divulgador cultural e editor da página literária impressa semanal “LÍTERO CULTURAL”, desde 15.agosto.1991, em parceria com o saudoso amigo/irmão/escritor José Ailton Ferreira “Bahia”, falecido em 21 de setembro de 2005, no jornal Alto Madeira.Com cerca de 1450 colaboradores no Brasil e mais em 35 países. Obras publicadas (poesia e prosa): REVER VERSO INVERSO (1991), NICTÊMERO (1993), POMO DE DISCÓRDIA (1994), RESQUÍCIOS PONDERADOS (1996) e LEONARDO, MEU NETO (antologia,2004). Livretos independentes (poesia): MORDE & ASSOPRA e suas causas internas e externas (1999), DESABAFOS em memória de ROY ORBISON (2003), Revista Antológica “Membros da Galeria dos Amigos do Lítero Cultural” (2004) e poesias traduzidas para o francês, inglês, alemão, italiano, japonês, russo, grego chinês, polonês e espanhol. www.selmovasconcellos.zip.net.
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*LILIAN MAIAL
*As Esperanças arrastadas por bem mais que sete quilômetros...
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*Comoção nacional, eu sei, mas não consigo trabalhar as coisas com o
imediatismo e a falta de memória da população. Não consigo me assustar em
proporções maiores com o caso desse menino que morreu arrastado por 7km,
preso pelo cinto de segurança ao carro que os bandidos roubaram, e que sua
mãe não conseguiu soltar, na pressa, do que com outros meninos arrastados a
uma vida que não tiveram escolha.
*Entendo a dor dessa mãe, dessa família, mãe como eu também o sou, percebo a
maldade, a falta de respeito à vida, a inversão de valores, porém me esforço
e não entendo o quanto tamanha violência possa ser maior que a dos idosos
incendiados no ônibus, presos por não terem a agilidade dos jovens para
escapar, ou a indiferença das pessoas diante dos meninos malabaristas de
sinal de trânsito (semáforo), ou ainda diante das meninas prostituídas,
quando ainda deveriam estar brincando de bonecas.
*É óbvio que vejo a gravidade do caso e a necessidade de providências,
contudo não sinto em quê esse fato é mais sério do que o descaso social com
as crianças todas, com a falta de vagas em escolas, as reformas educacionais
que não comportam o aprendizado, mas o passar de ano.
*Não imagino violência maior do que o estado de maquiagem de fachada dos
hospitais públicos, das escolas públicas, enfim, de quase todos os serviços
públicos, para os quais pagamos impostos exorbitantes, e que deveriam,
portanto, ser padrão de excelência em todo o mundo, porque não há país no
mundo que pague tanto para receber tão pouco.
*Se formos analisar a raiz de todo o mal e a violência que estão aí,
chegaremos num denominador comum, tão alardeado há muito por inúmeros
estudiosos, como o Professor Darcy Ribeiro, que é a educação (ou falta
dela). No planejamento do Professor Darcy Ribeiro para os CIEPs, era
imprescindível ocupar as cabecinhas das crianças com estudo, cultura, arte e
uma profissão, num ciclo integral na escola, de formação de homens de bem,
com alimentação balanceada de qualidade, assistência médica, odontológica e
psicológica, ensino profissionalizante, para que o adolescente já saísse com
chances de absorção pelo mercado de trabalho, com instrução, formação
profissional e cultura geral. O conhecimento gera o desejo de
desenvolvimento, de crescimento interior, com a cristalização de valores,
como a família, o estudo, o esforço individual para conquistas e sucesso.
*Sem a educação completa, o que vemos são crianças freqüentando a escola
para comer e farrear com colegas, muitos com péssimas influências sobre os
demais, como pequenos xerifes, já mostrando, desde a tenra infância, que há
dois grupos distintos: os que estão com eles e os que estão contra eles. Não
preciso dizer mais nada, não é?
*Crescendo assim ou no ócio, essas crianças irão se transformar em quê?
*A mim, me comove e me revolta ver crianças sem sala de aula, professores
sem dignidade, quase que apanhando dos alunos, diretores pressionados por
normas estabelecidas sem a vivência do ambiente escolar, sem noção da
realidade vivida em cada comunidade e em cada bairro.
*A população ainda não entendeu que quem comete hoje esses atos de barbárie
foram aquelas crianças ignoradas e esquecidas de ontem, foram aquelas para
as quais se fechava vidros de carros, se virava o rosto nas ruas, se evitava
olhar nos olhos famintos.
*Quantos filhos meus, nossos filhos, terão que ser arrastados por 7km, para
entendermos que muitos outros filhos já são arrastados na lama há décadas,
talvez séculos, sem que nenhum de nós se comova ou faça algo para
defendê-los.
*Hoje a população se revolta e enluta por esse menino de apenas seis anos,
barbaramente assassinado, mas continua a esquecer que os incontáveis meninos
de até bem menos idade continuam a serem arrastados a esse caminho, por
nossa culpa, por culpa da anuência dos pais dos outros meninos, cujos filhos
ainda poderão vir a serem arrastados amanhã. Se não acordarmos para a
situação social em que vivemos, em breve não teremos mais chance de abrir os
olhos.
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*CÉLIA JARDIM
*MINHA INDIGNAÇÃO
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*CASO JOÃO HÉLIO
*(Garoto de seis anos morto
no Rio da forma mais cruel)
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*Neste país dos absurdos
*tudo acontece e se esquece
*o que mais tem é impunidade
*neste poço de calamidade
*João Hélio partiu
*da forma mais brutal
*mas o bandido que o matou
*não responderá por crime penal
*Em três anos será liberto
*o que mais irá ele fazer
*é adolescente, mas um monstro
*deveria na prisão apodrecer
*A dor desta mãe não tem preço
*ver um filho morrer assim
*que tristeza viver num país
*onde não se vê justiça até o fim
*Se João Hélio fosse filho
*de um político qualquer
*o assassino teria a mesma sorte
*responda-me quem souber
*Sou contra a pena de morte
*mas com essa nossa pouca sorte
*prisão perpétua seria pouco
*para parar estes monstros soltos
*O que fazem nossos nobres políticos
*vendo tanta barbaridade
*cruzam os braços e pronto
*numa total cumplicidade
*Que mundo é este minha gente
*onde nos sentirmos protegidos
*se nada detém estes bandidos
*como seguir daqui pra frente
*Precisamos nos unir em um só grito
*exigir medidas reais de segurança
*ou muito em breve este grito será esquecido
*como o da mãe e irmã desta criança
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*MARISTELA TRINDADE
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*Vejo,
*existe uma imagem que quer saltar.
*Me chama em cores mutantes de todas as linhas
*que se debruçaram sobre
*meu berço, meu sexo,
*meu útero
*e
*minha mente perplexa.
*Tá tudo aqui, na caixinha de costura.
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*Nos tempos SUBWAY FROM ANYWHERE,
*sou uma naif bordadeira com linhas não costumeiras.
*Só teço o devir.
*-
*No silêncio da minha caixa de costura,
*mostro aos meus filhos que também são do mundo,
*o colorido de tantos cantos e desencantos
*nos bordados que fiz
*e os convido a tecer comigo
*sem temer ferir os dedos finos.
*-
*Quantas línguas tentam suturar as mentes shoppings de meus bens!
*-
*Todos,
*deturpados somos
*mas
*com tesoura afiada,
*eu os acalanto (filhos).
*Aguço a cor do olhar, vitral parindo tapetes.
*-
*Calar um pouco o vulgar dos ouvidos.
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*Vamos bordar nossas mentes,
*nossos ventres,
*quero parir mantos para os dias sem cor de histórias futuras na riqueza
*da caixinha de costura.
*-
*http://www.maristotelica.blogspot.com/
*########
*BETTY VIDIGAL
*Poema 13.
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*Vou desaparecer da tua vida,
*e ela vai ficar tão aborrecida!
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*Vou deixar a tua vida lisa e plana,
*sem graça como um início de semana,
*uma semana dessas bem compridas,
*sem expectativa de alegrias.
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*Uma sucessão de dias desbotados,
*tardes frias,
*noites descoloridas, madrugadas
*pálidas e mal dormidas.
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*Vou sumir até mesmo dos teus sonhos,
*não vou aparecer nem em delírios;
*tenho planos detalhados e perfeitos
*e quando os descobrires
*será tarde demais,
*não vai ter jeito:
*tudo vai parecer tão desenxabido,
*tão tristonho,
*tão desprovido de finalidade...
*E quando não houver mais nada que te agrade,
*te interesse,
*todos dirão que é depressão, estresse,
*mas nós dois saberemos que é saudade.
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*ALDEMAR NOREK
*NEON
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*mascavo e dissonante
*o celacanto
*esmaga flores rubras flores outrossim
*hiberna as estações como se não bastasse
*e antes macera
*o nervo flores bruma crivos som
*essa nervura
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*(úmida e quente, assim)
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*daqui do subsolo tudo é muito escuro – onde repousam meus olhos
*a luz pode cegar quem a deseja
*e o mundo ancora
*ancora
*ancora
*ancora
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*(levanta
*a perna amor
*mais
*um pouquinho)
*-
*no seu pulsar rascante
*todo de ar-
*estas contra o ar-
*estado círculo transfigurado áspera esfera
*já sem todo viço
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*(não para não para não para)
*-
*ainda assim deseja sobretudo se confrontar com a sagrada e in-
*traduzível música dos arpões.
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*LUCIANE SILVA
*ADOLESCÊNCIA
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*FASE DE TRANSIÇÃO
*COMEÇA A DECIDIR
*OS RUMOS DE SUA VIDA
*COM MUITA DETERMINAÇÃO
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*TEM CONSCIÊNCIA DE SEU VALOR
*CAPACIDADE E APTIDÕES
*MESMO NESSA FASE
*CHEIA DE ESCOLHAS E DECISÕES
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*O ADOLESCENTE
*TORNA-SE INDEPENDENTE
*PRECISA DE AMOR,
*CARINHO E ATENÇÃO,
*DA FAMÍLIA,PAZ E UNIÃO!
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*POSSÍVEIS SENTIMENTOS
*POESIAS E REFLEXÕES.
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*SÔNIA PRAZERES
*Autofagia
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*Cresce a carência
*O medo e a descrença
*Consumado o fato
*Sociedade e aparência
*Não buscamos mais vitrinas
*Elas são uma presença
*Nas ruas, nas telas, nos telefones.
*Por tudo se paga
*E o preço de tudo - moeda barata
*Não paga ou apaga a verdade
*O humano escondido
*Por trás dos sonhos falidos...
*... E sonhos não são vendidos.
*Não vendem as horas-ternura;
*E lojas não têm amigos
*Que zelem na dor e amargura.
*A droga assume e acompanha
*Embriaga e apaixona
*Companheira que brinda ilusões.
*Cresce uma autofagia
*Crematório do real acolhendo o imediato.
*Humanos, buscamos deuses?
*-Religião é ópio do povo!
*Ecoa o chavão e intimida:
*Melhor o ópio de fato, dependência,
*Que pôr consciência à vida.
*Fumaça, ampola, êxtase!
*Humano! supremacia demais!
*Quem é que pediu consciência?
*Paga caro a conveniência
*Em troca de uns gramas de paz.
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*MARCUS DI PHILIPPI
*Eternamente
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*O silêncio vago inspira
*Um não sei quê na distância...
*Música perdida, a lira
*Em meio à chamas, a pira,
*Perfume suave, fragrância.
*
*O vazio é magro, é fundo,
*Suavemente indistinto,
*É sono leve e profundo,
*Asas cansadas, o mundo
*Na taça de vinho tinto.
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*O silêncio, o sono, a vida,
*Cristais partidos, o nada.
*Um coro de voz comovida,
*A ave que voa esquecida,
*Em busca da alvorada.
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*ROCHA FILHO
*SÚPLICA
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*A senzala acorda quando a noite chega,
*As ferramentas lá para o canto vão,
*Na panela o peixe cheira ao longe
*E a fogueira aquece ao coração.
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*Soa a melodia de um trinado
*Canta a passarada ribeirinha,
*Segue mar abaixo a crioulada,
*Ruge a batucada pelo no congá,
*Repicando ao couro o pé sonora,
*Desfilando pelas notas do cantar,
*Dum cantador do igarapé do lago,
*Se escuta aos gritos noite adentro:
*Levanta-te cultura do meu Amapá!
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*SÔNIA DELSIN
*ÁVIDA POR TI
*
*Beije as minhas coxas devagar.
*Não existe pressa no amar.
*Teus lábios lentamente a deslizar...
*Quero que me cubra, mas de beijo.
*Quero palavras sussurradas.
*Quero mãos andando por minhas estradas.
*Sim, pelas estradas do desejo.
*Quero que me beije...
*Estou buscando tua boca no vazio da hora.
*Agora.
*Estou ávida por tua boca.
*Ávida por ti.
*Num tempo nosso me encontro.
*Um tempo que o céu permite.
*Ainda que na solidão eu chore.
*E no coração eu grite.
*####
*LENISE MARQUES
*Lua Nua
*-
*Varando o escuro da noite
*Ela deita sobre a terra
*O leitoso olhar
*Hipnótica claridade
*Noturnas sombras de luar
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*Lua! Redonda e magnífica!
*Qual celeste matrona
*Gorda e pálida
*Despudoradamente revelando
*Entre negras rendas
*A alva e luminosa pele
*-
*Bela e branca
*Absolutamente crua!
*Indecentemente nua!
*Esplendidamente...lua!
*####
*SANDRA RAVANINI
*Colombina de prata
*-
*As serpentinas colorem quantos sexos fecundos
*de ilusões que explodem nos primeiros segundos,
*e a menina nua, contempla essa passarela cerviz,
*tal a porta-estandarte da verde bandeira meretriz.
*-
*Pátria minha, conivente mãe e serena prostituta,
*brada a colombina de prata os orgasmos do sutra
*nos sussurros do asfalto figurando o irônico hino,
*que na voz encerra o desafeto contido no desatino.
*-
*Engravida de um arlequim qualquer que lhe come,
*melhor assim, poderia ser aids, fruto do codinome,
*e outros sem-tetos, e sem-nomes nascem na favela,
*onde o traficante vomita o pó na bandeira amarela.
*-
*O mundo assiste esgazeado o país dos fantasiados.
*Implora o abre-alas. Viva a bateria dos enganados!
*A colombina, agora de lata, na quarta das mínguas
*desperta na miséria azul, chorando à vida de cinzas.
*####
*CAROL
*Inocência roubada ...
*-
*No vestido roto de um azul desmaiado
*Cheirando abraços esquecidos,
*Ela perambula ao acaso.
*Esmola olhares, sorrisos, afagos,
*O olhar suplica e a lágrima que rola
*quem liga?
*Por que tal sina – meu Deus –
*A menina,
*nem bem cresceu e lhe fere a vida,
*abre feridas que não cicatrizam,
*pústulas exsudatas,
*de existência injusta que escorre
*da pele,
*murcha e seca de sol.
*Devia ser lisa a pele ainda menina,
*Cheirar alfazema,
*E ter o carinho de mãos de algum anjo,
*Mas de anjos, não sabe,
*Não sabe de sonhos, não espera nada, nem piedade,
*Nada mais tem que um olhar,
*Só um olhar que a alma resume
*e apunhala
*o meu olhar cru,
*essa nudez de alma
*sem perfume.
*###
*JANE BRANDÃO
*AVALANCHE DA VIDA
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*O vento sopra
*num ranger de dentes
*destrói ilusões
*mata sonhos
*enterra esperanças
*sem dó , nem piedade avança.
*Suas rajadas
*não deixam nada
*o pó escurece a alma
*sentimentos são arrastados
*folhas cobrem o chão
*tudo é sepultado
*sob os escombros
*do vendaval.
*####
*LUIZ DE AQUINO
*BAILARINA
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*Corpo no ar, esguio e sólido
*ciente de tudo o que lhe é de direito
*e suave.
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*Corpo cuidado e saudável, ornado de vestes.
*Base de concretas e delicadas
*sapatilhas.
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*Cabeça dotada,
*isenta de dores e trauma,
*apta ao domínio do espaço.
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*Ágil, leva o corpo ao ritmo
*e às magias da trilha melódica
*e faz das artes casamento
*íntegro, impecável, perfeito!
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*Por momentos eternos
*o baile acontece,
*e tudo em volta se envolve
*de encanto e leveza.
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*Os dias, as horas,
*tudo o que vem depois e como foi antes,
*volta à rotina, conduz a menina à dor do real.
*É preciso sobreviver.
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*Mas para viver, há que ser arte!
*http://penapoesiaporluizdeaquino.blogspot.com/
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