O outono brasileiro e o perigo que vem da Direita - Por João Paulo Saraiva Leão Viana

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Foto: Divulgação

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                                    O outono brasileiro e o perigo que vem da Direita 
                                                                                    “A história se repete, a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa”
                                                              Karl Marx, em O 18 Brumário de Luis Bonaparte
                                                                                                                                                     Por João Paulo Saraiva Leão Viana
 
Há mais de vinte anos, desde o Fora Collor, em 1992, a sociedade brasileira não vivenciava manifestações de rua como as realizadas nos últimos dias. Assim como milhões de brasileiros não tenho condições mínimas de prever o alcance e os rumos dos acontecimentos nos próximos dias. Trata-se de uma conjuntura imprevisível, onde os analistas mais astutos provavelmente não se arriscariam – sob o risco de cometerem equívocos monumentais. Todavia, algumas características presentes nas manifestações têm despertado minha atenção e sob esses pontos tecerei alguns comentários.
                De fato, o estopim para a eclosão das manifestações foi o aumento da tarifa de ônibus na cidade de São Paulo. A partir das demandas do Movimento Passe Livre (MPL), com a injeção de poder das redes sociais, milhões de pessoas saíram às ruas pelo Brasil, ainda que sem uma plataforma concreta e, visivelmente, sem uma liderança vertical. A reivindicação contra o aumento da passagem é apenas a ponta do ice berg, evidenciando gravíssimos problemas da vida urbana nos grandes centros, mais especificamente ligados ao transporte público e a mobilidade. Diante da incapacidade do Estado em oferecer políticas públicas de qualidade, a vida nos grandes cidades torna-se cada vez mais difícil.
Em meio a essa conjuntura, na última quarta-feira, tive a oportunidade de participar de um seminário sobre os rumos do Lulismo, realizado no DCP-UNICAMP, tendo como expositor o cientista político e jornalista André Singer, professor da USP e porta voz da Presidência da República durante boa parte do governo Lula. A exposição, agendada desde o início do semestre, foi alterada, em seu conteúdo, pelo autor, devido, sobretudo, a conjuntura específica do país, inédita nas últimas duas décadas.
Assim, Singer iniciou sua apresentação buscando traçar uma breve análise dos movimentos, com o objetivo de situar a relação entre os últimos acontecimentos e o governo Dilma. Nesse sentido, o argumento central foi o de que as pessoas saíram às ruas porque buscam o aceleramento das mudanças sociais iniciadas há 10 anos, e que, devido principalmente ao contexto de crise mundial, estancaram. Ou seja: os cidadãos querem mais investimento público nas áreas da saúde, educação, transporte, segurança, reivindicam a presença do Estado, observando nele o agente responsável por guiar o processo de transformação social.
 Conforme Singer, ao abandonar o radicalismo em 2002, o PT apresentou-se como alternativa de poder, obtendo sucesso em sua estratégia por construir um pacto de classes entre trabalhadores e a grande burguesia nacional, não ocasionando a ruptura da institucionalidade democrática do país. Ademais, a fortuna maquiaveliana de Lula teria sido a bonança na economia mundial em 2003, aliado ao aumento substancial nos valores das commodities – nosso principal produto de exportação.
Por outro lado, a virtú do governo Lula foi apostar que a conjugação de medidas como Bolsa família, crédito consignado e o aumento real do salário mínimo – aliado ao pleno emprego (ao todo 17 milhões de empregos criados em 10 anos, ainda que majoritariamente de caráter informal), poderia proporcionar o crescimento do país mediante a criação de uma nova classe consumidora, que ao entrar no mercado potencializou a economia através do consumo. Nesse sentido, o pacto classista entre proletariado e a grande burguesia nacional, assentado sob um programa econômico inspirado no Keynesianismo, seria a base de sustentação do Lulismo.  As reflexões de Singer sem dúvida nos fornecem uma plataforma de idéias para o aprofundamento do debate político da atual situação brasileira e os rumos futuros do país.
Entretanto, a meu ver, um dos elementos mais preocupantes presentes nas manifestações é o caráter antipartidário dos protestos, que ameaça a democracia representativa brasileira. Com o PT no poder e distanciado dos movimentos sociais, até partidos como PSOL e PSTU, de notável enraizamento nas lutas sociais, foram marginalizados aos gritos de “Fora Partido”. De certo, encontra-se aí uma boa oportunidade para que as agremiações partidárias possam se reaproximar da sociedade, isso serve tanto para o PT, e demais partidos de esquerda, quanto para a centro-direita, representada pela PSDB.
Se as instituições importam, e acredito que sim, uma boa medida para tentar reaproximar os partidos dos cidadãos seria a proibição de doação de recursos por parte de empresas e o incentivo a pequenas doações do cidadão comum. Contudo, tal sugestão seria apenas o início, pois os partidos precisam buscar apoio nas ruas, se fortalecendo nas bases. Como bem salientou o professor Jairo Nicolau “os partidos brasileiros envelheceram”, não somente porque seus líderes sãos os mesmos de trinta anos atrás, mas porque as legendas, e principalmente o PT, não conseguem mais cooptar a juventude para a organização partidária.
Ao passo que é crescente o sentimento anti-partidário, danoso ao ideal democrático, aumenta a voz dos setores conservadores que aproveitam para conclamar o pedido de  impeachment da presidente, tentando caracterizar Dilma Rousseff como o alvo das manifestações. Aí, vale uma pergunta:  A quem interessa a ruptura do regime democrático, que a duras penas conquistamos e mantemos há 25 anos?
Em 1954, essas forças foram responsáveis pelo suicídio de Getúlio Vargas. No ano de 1955, não aceitavam a posse de Juscelino Kubitschek. Posteriormente, em 1961, após a renúncia de Jânio Quadros tentaram impedir o vice João Goulart de assumir o poder, o que não houve graças a figura heróica de Leonel Brizola, então governador do Rio Grande do Sul. Ainda sim, através de uma emenda constitucional, as forças conservadoras emplacaram o sistema de governo parlamentarista, cerceando os poderes de Goulart, o que duraria pouco mais de um ano, até o retorno do presidencialismo no início de 1963.
 No próximo ano, completaremos 50 anos do golpe militar de 1964, que derrubou João Goulart e nos enfiou numa ditadura que só terminaria em 1985, e eu não tenho a menor dúvida em afirmar que o perigo vem da Direita.
João Paulo Saraiva Leão Viana é cientista político, professor da Faculdade de Rondônia (FARO) e da Faculdade Católica de Rondônia (FCR).
 
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