1 – SOBRINHO ELEGÍVEL
Não admira que o prefeito Roberto Sobrinho (PT), de Porto Velho, ande tão lépido e fagueiro de uns tempos para cá. Principalmente no que diz respeito às movimentações de bastidores objetivando angariar apoios no interior do seu partido de modo a levar seu nome à convenção de junho em busca da candidatura da legenda para disputar a sucessão do governador Ivo Cassol (PP) em 2010. De mesmo modo, não correrá grandes riscos de perder uns cobres quem apostar que a claque que estará defendendo a sua postulação neste sábado (17), no “Ato Político” que a agremiação estará realizando em Ariquemes, deverá ser a mais portentosa e animada. Sobram-lhes – ao prefeito Sobrinho e sua gente – razões para tanto saracoteio.
Salvo melhor juízo – e o que se seguirá vai sancionado por apreciações de especialistas vários -, o prefeito Roberto Sobrinho, leitor, desde o dia 30 passado, quando a edição do Diário Oficial da União (DOU) com essa data trouxe publicada a íntegra da Lei 12.034/09, está elegível. Ele e mais um magote de políticos país afora a quem a Justiça Eleitoral, com base na Resolução 22.715/2008, interditava a certidão de quitação eleitoral nos casos em que o interessado tivesse tido a prestação de contas rejeitada. Aliás, a eleição de 2010 seria a primeira em que essa resolução seria aplicada, mesmo assim, a partir de uma decisão ainda por se completar, porquanto aos juízes do TSE ainda falta julgar quanto tempo os políticos teriam para colocar as contas em dia.
Para entender o que se está falando e se vai dizer ao navegar pelos labirintos do “juridiquês”, melhor tentar recuperar a memória desse imbróglio. Eis que a Resolução 21.609, que dispôs sobre a prestação de contas nas eleições municipais de 2004, e a Resolução 22.250, sobre as eleições de 2006, estabeleceram que a não apresentação de contas de campanha impediria o recebimento de quitação eleitoral no curso do mandato. Essas resoluções, porém, não trataram da desaprovação de contas.
2 – QUESTÃO INCONCLUSA
A discussão do caso começou depois que o ministro Ari Pargendler, que foi relator das instruções para as eleições de 2008, incluiu na resolução um parágrafo que "atribui efeitos à decisão que desaprova contas". Isso significou, na avaliação de Pargendler que se "antes a falta de prestação de contas impedia a expedição de certificado de quitação, agora a própria desaprovação, ou seja, a prestação de contas mal feita e, portanto, desaprovada também, inibiria o fornecimento da quitação".
A ação que gerou o entendimento procedeu do Tribunal Regional Eleitoral de Goiás (TRE/GO) e tratou da omissão de todos os ex-candidatos das eleições de 2004 que não prestaram contas no tempo estipulado em lei. A recusa ou o descumprimento levara a Justiça Eleitoral a negar a certidão de quitação eleitoral exigida para instruir o pedido de
registro de candidatura. A questão da restrição à quitação eleitoral despertou o interesse do TSE.
O julgamento da ação foi dividido em partes. Os ministros concluíram a primeira parte sobre a aplicação da resolução na concessão da quitação eleitoral para as prestações de contas futuras. Agora, na segunda parte, os ministros iriam debater quanto tempo os candidatos devem ter para colocar em ordem a situação junto à Justiça Eleitoral no caso das contas desaprovadas.
A Resolução 22.715/2008 estabeleceu que o prazo deve ser a duração do mandato para o qual concorreu o candidato. Contudo, o ministro Joaquim Barbosa propôs uma alteração na norma para que esse prazo ficasse em aberto até que o candidato quitasse sua prestação de contas, uma vez que recebe recursos públicos do Fundo Partidário. Somente assim, segundo o ministro, o candidato poderia obter a certidão de quitação.
O julgamento foi retomado com a apresentação do voto-vista do ministro Marcelo Ribeiro que, na primeira parte acompanhou o relator. Mas com relação à segunda parte, o julgamento ficou inconcluso devido a um novo pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa, para melhor análise.
3 – MORTA A COBRA
Pois bem. As coisas estavam nesse pé quando o tal da reforma eleitoral entrou, pela enésima vez, na pauta do Congresso no começo do semestre – como nas ocasiões anteriores, sempre às vésperas do prazo em que uma lei pode ter validade para a eleição seguinte. Com uma montoeira de prefeitos e vereadores de olho nas eleições de 2010, mas pendurados pela Resolução 22.715/2008, a pressão sobre o parlamento foi incomensurável. Num primeiro momento, sob inspiração de deputados e senadores mais açodados, incluiu-se na proposta da reforma simplesmente uma anistia geral. Aí foi a pressão da opinião pública que se fez sentir e a chiadeira é que foi geral.
De repente, como por encantamento, o assunto sumiu do noticiário. Parecia que os congressistas, sob pressão da opinião pública, haviam se lixado e abandonado suas bases à própria sorte. Qual o quê, considerado. Quando o texto da minirreforma eleitoral veio a lume é que se viu o quanto pode ser ingente a sutileza dos políticos. No caso de Roberto Sobrinho e de todos na mesma situação, acrescentou-se um providencial parágrafo (no caso, o § 7º) ao Art. 11 da Lei 9.504 e a cobra restou morta e enterrada. A lei em questão é a que estabelece as normas das eleições. E o Art. 11 é o que trata dos registros das candidaturas, enumerando os documentos que os instrui – entre os quais a bendita certidão de quitação eleitoral. E o que diz o parágrafo lá acrescentado? Pela transcrição:
“§ 7º A certidão de quitação eleitoral abrangerá exclusivamente a plenitude do gozo dos direitos políticos, o regular exercício do voto, o atendimento a convocações da Justiça Eleitoral para auxiliar os trabalhos relativos ao pleito, a inexistência de multas aplicadas, em caráter definitivo, pela Justiça Eleitoral e não remitidas, e a apresentação de contas de campanha eleitoral.”
Quer dizer, basta a apresentação das contas da campanha. Se foram ou deixaram de ser aprovadas, são outros quinhentos. Está em vigor desde o dia 30 passado. Atente o considerado para a expressão “exclusivamente”. Ou seja, além de bater o prego, os congressistas ainda viraram a ponta. O que confirma o brocardo segundo o qual, leitor, político, como até os candirus do Madeira estão calejados de repetir, não bate prego sem estopa.