1 – CEBS EM MARCHA
A mídia local, especialmente a de Porto Velho, pelo visto, ainda não se tocou – como se diz pelaí. Mas o que está sendo concebido bem debaixo das suas barbas, sem que tenha, até agora, merecido a atenção que lhe é devida, é o que deverá se constituir, simplesmente, no maior acontecimento político, social e religioso deste ano da graça de 2009 na capital rondoniense - que vem a ser o12º Intereclesial das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), previsto para acontecer no período de 21 a 25 de julho, tendo como tema “Ecologia e Missão” e como lema “Do Ventre da Terra, o Grito que Vem da Amazônia”
Para se ter uma idéia da sua magnitude, conste que o encontro similar anterior, o 11º Intereclesial das CEBs, realizado em julho de 2005, em Ipatinga (MG), registrou a presença de 4.000 delegados de CEBs provenientes de 269 dioceses brasileiras, entre eles 420 religiosos, 380 padres e 50 bispos. Participaram ainda 70 convidados de outros países (principalmente da América Latina) e a representação das populações indígenas compareceu com 80 membros.
Como todo evento sob a responsabilidade de organizações religiosas, este também está sendo criteriosamente organizado mediante a observação de meticuloso planejamento, tendo sido precedido de várias providências, como a Reunião de Preparação (em janeiro de 2008), o Encontro Arquidiocesano de CEBs, também chamado “Dozinho” (em setembro), o.II Seminário “Caminhos de Construção Democrática de uma Nova Amazônia” (em novembro) e outros.
É neste contexto preparatório que está inserido o lançamento, nesta sexta-feira (23), às 9h, no Centro Arquidiocesano de Pastoral (CAP - km 14 da BR-364, sentido Cuiabá), do texto base do 12º Intereclesial das CEBs, intitulado, “Do Ventre da Terra, o Grito que Vem da Amazônia”. Organizado por Valdecir Luiz Cordeiro,presbítero da Arquidiocese de Porto Velho e integrante do Secretariado do 12º Intereclesial, o livro tem como proposta um aprofundamento da dimensão missionária e ecológica das CEBs.
2 – JUSTIÇA E PAZ
O livro, conforme texto distribuído pela assessoria, está estruturado em três partes, seguindo o método Ver-Julgar-Agir. A 1ª parte, “O Grito da Terra e dos Povos Amazônicos”, descreve a realidade, um olhar amplo e atento e ajuda a entender que o que chamamos de “Amazônia”. Em seguida, reflete sobre a relação entre o bioma e as formas de ocupação e exploração da região e fala da maneira como vemos e vivemos a região. Sobre a arquitetura da Amazônia, numa alusão ao que queremos e podemos fazer daqui em diante, mostra como a Amazônia foi vista ao longo da história.
De cunho mais interpretativo, a 2ª Parte busca refletir sobre a realidade descrita a partir da fé, chamando a atenção à situação de grave desequilíbrio da vida no planeta, enfatizando que tal realidade desafia a encontrar caminhos para cuidar da Terra e garantir o futuro da vida e da fé. Estabelece uma relação entre a Revelação de Deus e a história da humanidade e apresenta chaves de compreensão para uma leitura amazônica da bíblia. Trata do diálogo entre as Igrejas cristãs em favor da vida e da justiça e fala da importância do ecumenismo, da busca da unidade na fé e na caridade.
Caracterizado como o mais propositivo, o texto da 3ª Parte - “Clamor por Justiça, Partilha e Paz” - trata do tema da missão a partir da perspectiva da alteridade. Apresenta com entusiasmo as CEBs e as Missões Populares, afirmando que estas continuam firmes e que não há mais dúvidas de que a missão é a sacudida que deve mantê-las acordadas. Fala ainda sobre a evangelização libertadora e apresenta cinco passos para o fortalecimento e firmeza das CEBs na sua caminhada. Por último, três experiências ecológicas alternativas são apresentadas, iniciativas modestas, mas paradigmáticas, na medida em que mostram a possibilidade de intervir na natureza de maneira sustentável. Entre estas, a da indígena “Professora Eva”, da etnia Canoé, de Guajará-Mirim-RO, apresenta a alternativa de comercialização de produtos produzidos em Sagarana.
3 – GRITOS DO POVO
As CEBs surgiram das decisões do Concílio Vaticano II, realizado na primeira metade da década de 60, que colocou como prioridade para a igreja a "opção preferencial pelos pobres". Hoje, dados oficiais da CNBB indicam que existem mais de 100 mil CEBs espalhadas no Brasil. O número de participantes de uma CEB varia de 30 a 200. Sua formação pode ser definida tanto por uma região geográfica, como um bairro, quanto por uma paróquia. As atividades de uma CEB vão das orações até a organização de movimentos de luta por moradia, creches e postos de saúde. Também é comum que elas organizem festas religiosas.
A explosão do movimento no Brasil ocorreu nos anos 70 e 80, durante o regime militar. Elas praticamente foram hegemônicas como movimento popular quando o governo perseguia outras organizações. Em determinado momento, o elevado nível de politização das CEBs assustou o Vaticano. Dois fatores contribuíram para isso. No Brasil, integrantes das comunidades participaram da luta pela redemocratização, dando um caráter militante ao movimento. Um fenômeno semelhante ocorreu na revolução sandinista da Nicarágua. Lá, padres e líderes católicos transformaram-se em guerrilheiros.
As CEBs nos tempos atuais, conforme escreve D. Eurico dos Santos Veloso, Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora (MG), “se justificam e se impõem como o meio mais coerente e eficaz de ser cristão, pois na atual conjuntura de empobrecimento e exclusão das massas, não há outro caminho, para a sobrevivência dos pobres, que não sejam comunidades humanas, humanizadas, fraternas e solidárias, que têm a missão de acolher e cuidar de todos, no mesmo espírito de Atos dos Apóstolos.”
E por aqui D. Moacir Grechi proclama: “Queremos ser Igreja provocadora e profética, forte e articulada que contribua para tornar mais eficazes os gritos do povo: grito dos excluídos, grito dos povos da Amazônia, grito da terra, deixando claro de qual lado estão os seguidores de Jesus e qual é o mundo que desejam construir.”