Parecia. Depois de entrar em um longo processo decadente frente à concorrência e se tornar vítima de seu próprio mal – a ‘orkutização’; nesta terça-feira, 30 de setembro, a pioneira rede social do Google encerra as atividades deixando um enorme legado à s
Foto: Divulgação
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Em janeiro de 2004, pouco menos de um mês antes de o hoje todo-poderoso Mark Zuckerberg lançar o thefacebook – protótipo do que posteriormente viria a ser a atual maior rede social do mundo, o Orkut entrava no ar pela primeira vez. Batizado com o nome de seu idealizador, o turco Orkut Büyükkökten, a rede social americana rapidamente se popularizou no Brasil transformando-se em uma febre que parecia não arrefecer.
Parecia. Depois de entrar em um longo processo decadente frente à concorrência e se tornar vítima de seu próprio mal – a ‘orkutização’; nesta terça-feira, 30 de setembro, a pioneira rede social do Google encerra as atividades deixando um enorme legado à social media e uma multidão de brasileiros nostálgicos.
Desde seu surgimento o Orkut teve grande impacto no Brasil, o que não veio a acontecer de forma concreta e duradoura em seu próprio país de origem, onde os números da época já mostravam a inclinação dos americanos pelo falecido MySpace, lançado em 2003.
Não demorou para os brasileiros superarem os EUA na quantidade de usuários cadastrados: em junho de 2004 o país saiu da terceira posição para assumir a liderança no Orkut, com 30,63% do uso da rede, o que levou o Google a criar uma versão em português no ano seguinte.
A adesão em massa, na época só possível através de convites de usuários já cadastrados, fomentou reações xenófobas que rechaçavam a onda verde e amarela. No entanto, comunidades como a ‘Too Many Brazilians on Orkut’ (‘Muitos brasileiros no Orkut’, em português) logo foram engolidas pela brasilidade dos usuários.
A prosperidade da rede social se manteve sólida e intocável por seis anos no Brasil. Em 2006, cerca de 70% dos usuários eram brasileiros, participação que foi proporcionalmente reduzida quando indianos e paquistaneses também se apaixonaram pelo Orkut. Mas os queridinhos nunca deixaram de estar no Brasil. Os laços com o país foram tão estreitos que em 2008, quando mais de 50% de seus usuários eram brasileiros – e consequentemente o número de processos judiciais também, o Google transferiu a sede administrativa da rede social da Califórnia para a capital mineira Belo Horizonte.
O Orkut estava consolidado nas terras tupiniquins e intrínseco ao processo que incluiu progressivamente os brasileiros na web, hoje responsáveis por 10% do tempo consumido globalmente pelas redes sociais, perdendo apenas para os EUA. Até mesmo aqueles que não possuíam uma conexão de boa qualidade, na época grande parte da população, tinham a chance de acessar seus perfis no Orkut com a opção de exibir a versão simplificada da página em HTML.
– O Orkut foi fundamental para introduzir as redes sociais no Brasil e difundir a utilização geral da Internet – explica a professora e pesquisadora do Laboratório de Tecnologia de Comunicação, Cultura e Subjetividade da Uerj, Letícia Perani. — A chamada ‘inclusão digital’ brasileira deve muito a essa rede. Nos estudos de Comunicação e Cibercultura, o Orkut foi um objeto de estudo fundamental para explicar as novas formas de sociabilidade e construção do conhecimento que temos hoje com as ferramentas web — explica.
Em 2010, um ano após o Orkut passar por sua primeira repaginada de funcionalidades e layout, o Ibope apontava liderança absoluta da rede (91% dos acessos) comparado ao Facebook (14%) e ao Twitter (13%). No entanto, confirmando a previsão dos gurus tecnológicos e de parte da imprensa especializada, no ano seguinte, o fenômeno de Mark Zuckerbeg engoliu o Orkut, que nunca mais foi o mesmo. Em agosto de 2011, o Facebook registrou 30,9 milhões de usuários, cerca de dois milhões a mais que seu maior concorrente em território nacional. A queda foi livre e irrefreável: desde a ultrapassagem, num período de três anos, a participação do Orkut em acessos fixos no Brasil diminuiu 95,6%.
Para a pesquisadora da Uerj, a ‘novidade’ que o Facebook representava não foi um fator decisivo para a derrocada do Orkut, e sim o comportamento que a ‘rede social do momento’ estabeleceu aos usuários somado à incapacidade do Orkut de se adaptar aos tablets e smartphones:
— O Facebook se mostrou uma ferramenta mais de acordo com as necessidades do internauta 2.0. Ao compartilhar conteúdo na linha do tempo, o usuário se torna fonte de informação, seja pessoal ou de interesse público. Enquanto o Facebook parece um bate-boca rápido, quase que instantâneo, o Orkut mais parecia um mural de informações sobre as pessoas — reflete.
Numa tentativa de combater o crescimento do Facebook, o Google lançou, em 2011, o Google+, rede social que pretendia integrar todos os serviços da empresa. A ferramenta, que nunca chegou a decolar no Brasil, deixou o Orkut ainda mais para escanteio.
Em junho deste ano, o Google lançou um comunicado anunciando o inevitável: o Orkut encerraria as atividades no dia 30 de setembro, deixando 6 milhões de órfãos brasileiros que ainda são ativos na rede. A reação foi instantânea: nostálgicos, fãs de todo o país reuniram quase 90 mil assinaturas em uma petição online para que o gigante da tecnologia não encerrasse a memória viva do comportamento social brasileiro na internet. Não surtiu efeito, amanhã o Orkut fecha as portas. ‘Sdds’ (saudades, em ‘internetês’), Orkut.
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