Política em Três Tempos - Por Paulo Queiroz

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Foto: Divulgação

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1 – NOVO MARTÍRIO Expresso em carta aos fiéis, o compromisso é o de jejuar até a morte caso o governo Lula da Silva (PT) não cumpra o que prometeu. Pois bem. A exemplo do que já fizera há dois anos, o bispo dom Luiz Flávio Cappio retomou a greve de fome contra a transposição das águas do rio São Francisco, cujo projeto o governo pôs em andamento sem promover o debate que prometera ao religioso na ocasião em que negociou para dissuadi-lo do 1º protesto. No momento em que estas estão sendo digitadas, o noticiário dá conta de que o bispo está com 70 quilos, três a mais do que pesava quando iniciou a 1ª greve de fome e dois a menos do que quando começou a jejuar há nove dias. Agora na Capela de São Francisco, em Sobradinho (PE), o bispo passa os dias fazendo campanha corpo-a-corpo em favor da sua tese. O religioso, que nesta terça-feira (04) entrou na 2ª semana de jejum, passa a maior parte do tempo sentado dentro de uma sala abafada, coberta por telhas de amianto, sob a mira constante de um ventilador e acompanhado por pelo menos 10 seguidores. A cada meia hora bebe, em uma caneca de plástico amarelo, água do rio São Francisco, filtrada em um pote de barro. À noite, reza uma missa e aproveita para explicar a razão do seu protesto. Dom Cappio dorme em um colchão colocado sobre o chão de cimento. Suas roupas, que ele mesmo lava, secam sobre cordas de náilon presas à parede. Suas razões? Reproduzam-se as suas palavras e tire o leitor as conclusões. “Quando encerrei o jejum de 11 dias em Cabrobó, há dois anos, acreditei sinceramente que o governo federal cumpriria sua palavra empenhada no acordo que assinamos. Este acordo estabelecia um amplo, transparente e participativo debate nacional sobre o desenvolvimento do Semi-árido e da Bacia do São Francisco. Acreditávamos piamente que se esse debate fosse verdadeiro seriam esclarecidas as reais necessidades e potencialidades do Semi-árido, e ficaria evidente que a transposição não era necessária nem conveniente ao povo nem ao rio. 2 – RAZÕES DE CAPPIO As águas abundantes do semi-árido falariam por si. E os projetos alternativos existentes se imporiam, como as obras do Atlas Nordeste para o meio urbano e as experiências da ASA - Articulação do Semi-Árido para o meio rural. O governo não cumpriu o prometido, abortou o debate apenas iniciado, ganhou as eleições e colocou o Exército para começar as obras da transposição. Movimentos e entidades da sociedade organizada intensificaram as mobilizações e os protestos, mas o governo se fez de surdo. Diante disso, não me restou alternativa senão retomar o jejum e a oração, como havia dito que faria se o acordo não fosse cumprido. Para isso escolhi a capela de São Francisco, em Sobradinho - BA, bem próximo da barragem de Sobradinho, que há 30 anos passou a ser o coração artificial do Rio São Francisco, neste momento um doente em estado terminal. Sei que meu gesto causará estranheza e incompreensões em muitos de vocês. Não os culpo por isso. Há gerações vem sido dito a vocês que só a grande obra da transposição "resolve" a seca. Entre os maiores interessados nela estão pessoas que vocês bem conhecem, pois são as mesmas que há muitos anos dominam e exploram a região usando o discurso da seca para desviar dinheiro público e ganhar eleições. A seca não é um problema que se resolve com grandes obras. Foram construídos 70 mil açudes no Semi-árido, com capacidade para 36 bilhões de metros cúbicos de água. Faltam as adutoras e os canais que levem essa água a quem precisa. Muitas dessas obras estão paradas, como a reforma agrária que não anda. Levar maiores ou menores porções do São Francisco vai tornar cara toda essa água existente e estabelecer a cobrança pela água bruta em todo o Nordeste. O povo, principalmente das cidades, é quem vai subsidiar os usos econômicos, como a irrigação de frutas nobres, criação de camarão e produção de aço, destinadas à exportação. Assim já acontece com a energia elétrica, que é mais barata para as empresas e bem mais cara para nós. 3 – DEUS NOS AJUDE Essa é a verdadeira finalidade da transposição, escondida de vocês. Os canais passariam longe dos sertões mais secos, em direção de onde já tem água. Portanto, não estou contra o sagrado direito de vocês à água. Muito pelo contrário, estou colocando minha vida em risco para que esse direito não seja mais uma vez manipulado, chantageado e desrespeitado, como sempre foi. Luto por soluções verdadeiras para a vida plena do povo sertanejo - isso tem sido minha vida de 33 anos como padre e bispo do sertão. É, pois, um gesto de amor à vida, à justiça e à igualdade que nunca reinaram no Semi-árido, seja aí, seja aqui no São Francisco, longe ou perto do rio. Agora mesmo é grande o sofrimento do povo não muito distante do rio e do lago de Sobradinho que, em função da energia para um desenvolvimento contra o povo, está com apenas 14% da sua capacidade. Um projeto de R$13 milhões que resolveria o abastecimento dos quatro municípios da borda do lago espera desde 2001 pelo interesse dos governantes... O São Francisco precisa urgentemente de cuidados, não de mais um uso ganancioso que se soma aos muitos que lhe foram impostos e o estão destruindo. Como lhes disse da outra vez, fosse a transposição solução real para as dificuldades de água de vocês, eu estaria na linha de frente da luta de vocês por ela. O que precisamos, não só no Nordeste é construir uma nova mentalidade a respeito da água, combater o desperdício, valorizar cada gota, para que não ela não falte à reprodução da vida, não só a humana. Precisamos repensar o que estamos fazendo dos bens da terra, repensar os rumos do Brasil e do mundo. Ou estaremos condenados à destruição de nossa casa e à nossa própria extinção, contra o Projeto de Deus. Senhor, Deus da Vida, ajude-nos! "Para que todos tenham vida!" (João 10,10). Recebam meu abraço e minha benção, Dom Luiz Flávio Cappio, Ofm”. Nesta terça-feira o arcebispo de Salvador, dom Geraldo Majella Agnello, foi a Sobradinho pedir o encerramento do jejum. Cappio disse que não recuará. O religioso se encontrou com Majella e mais quatro bispos. No encontro, recebeu uma carta com a posição da Regional Nordeste 3 (Bahia e Sergipe) da CNBB. A entidade é solidária à luta do bispo, mas discorda da forma escolhida para isso. Cappio afirmou que via o pedido de recuo feito por Majella como um gesto de preocupação com a sua vida. Enfim, o bispo condiciona a suspensão do protesto à saída do Exército do canteiro de obras e ao arquivamento do projeto da transposição. Até a véspera desta publicação, o governo nem “tchuns”. E o protesto de dom Cappio, pelo jeito, desta vez não ficará só nisso.
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