O relator do Projeto de Lei Antifacção no Senado, senador Alessandro Vieira (MDB-SE), apresentou na quarta-feira (3) um novo texto para a proposta aprovada na Câmara dos Deputados sob forte resistência do governo federal. A versão revisada altera pontos sensíveis do relatório do deputado Guilherme Derrite (PP-SP) e restabelece dispositivos alinhados ao projeto originalmente enviado pelo Executivo.
A principal mudança é a criação do tipo penal de “facção criminosa”, definido como uma espécie de organização criminosa, com pena de 15 a 30 anos de prisão. A pena pode dobrar para líderes da organização e ainda ser agravada em até dois terços. Vieira também equiparou milícias privadas ao crime de facção criminosa, reforçando o enquadramento dessas estruturas como organizações criminosas.
Outra alteração importante envolve o capítulo financeiro do combate ao crime organizado ponto de maior atrito entre o Planalto e a Câmara. Derrite havia previsto a destinação de bens apreendidos diretamente aos fundos de segurança. Vieira, porém, incluiu um novo tributo sobre apostas de quota fixa (bets), com alíquota de 15% da Cide-Bets, para financiar ações de prevenção e repressão ao crime organizado. O texto ainda concede ao governo federal seis meses para apresentar uma proposta de reestruturação dos fundos nacionais de segurança pública.
Trechos aprovados pelos deputados que restringiam direitos fundamentais foram suprimidos. A Câmara havia incluído a vedação ao auxílio-reclusão para dependentes de integrantes de organizações criminosas ultraviolentas e a limitação do direito ao voto para presos provisórios. O relator retirou esses pontos, afirmando que só podem ser alterados por meio de emenda constitucional não por projeto de lei.
No campo da investigação, Vieira manteve a possibilidade de monitoramento de encontros entre presos ligados a facções e seus advogados, desde que com autorização judicial e com “fundadas suspeitas de conluio criminoso”. O juiz responsável deverá comunicar a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) por meio de ofício sigiloso. O texto também autoriza, mediante decisão judicial, o uso de softwares de intrusão, como spywares, para interceptar comunicações de organizações criminosas ultraviolentas e milícias.
Integrantes do Ministério da Justiça consideraram o novo relatório mais alinhado ao projeto original do governo e elogiaram o resgate da “coerência jurídica” do texto.
Principais mudanças entre os textos de Derrite e Vieira
Tipos penais
• Como era (Câmara):
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“Domínio social estruturado”: pena de 20 a 40 anos
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“Favorecimento ao domínio social estruturado”: 12 a 20 anos
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• Como ficou (Senado):
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“Facção criminosa”: pena de 15 a 30 anos
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“Facção criminosa qualificada”: pena pode dobrar para líderes
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Milícias privadas podem ser classificadas como facção criminosa e organização criminosa
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“Favorecimento”: pena de 8 a 15 anos, sem crime em caso de coação irresistível
Financiamento da segurança pública
• Como era (Câmara):
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Bens apreendidos iriam para fundos estaduais ou para o FNSP quando a PF atuasse
• Como ficou (Senado):
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Criação da Cide-Bets, tributo de 15% sobre apostas
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Destinação dos recursos para ações de combate ao crime organizado
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Governo tem 6 meses para reestruturar fundos de segurança
Auxílio-reclusão e direito ao voto
• Como era (Câmara):
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Proibição de auxílio-reclusão a dependentes de criminosos ultraviolentos
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Restrição ao voto de presos provisórios
• Como ficou (Senado):
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Ambos os pontos foram retirados por inconstitucionalidade
Uso de tecnologia na investigação
• Como era (Câmara):
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Monitoramento de conversas entre presos e advogados em caso de “razões fundadas”
• Como ficou (Senado):
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Monitoramento só com autorização judicial e “fundadas suspeitas”
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OAB deve ser notificada sigilosamente
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Autorizado o uso de spywares contra facções e milícias mediante ordem judicial
O texto agora segue para apreciação do plenário do Senado, onde poderá sofrer novos ajustes antes de retornar à Câmara ou seguir para sanção.