Henrique Duarte Prata, diretor geral da Fundação Pio XII, conhecido como Hospital de Barretos, fala sobre os números elevados de câncer, a extensão de Barretos para o Estado, a falta de investimentos, dentre outros assuntos abordados no decorrer desta entrevista.
O jornalista Paulo Henrique Silva, que acompanha, juntamente com sua mãe, o tratamento de câncer pulmonar de seu pai, aproveitou o ensejo para realizar uma série de entrevistas com pacientes que se deslocam com ou sem o TFD (Tratamento Fora de Domicílio) concedido pelo Governo do Estado.
Confira a entrevista exclusiva de Henrique Prata ao site Rondoniainfoco:
Paulo Henrique: Por que o senhor afirma que o tratamento de câncer de RO não serve nem para animal? Explique sua afirmação!
Henrique Prata: Eu não fui à Porto Velho para assumir a gestão do câncer no Estado, mas para ver como os pacientes são tratados no setor de oncologia do hospital de Base. Meu coração ficou sensibilizado. As instalações que estão inseridas no HB não servem para nenhum tipo de animal, de porco a cavalo, muito menos para seres humanos.
Hoje o paciente com câncer, internado em Rondônia, tem mais chances de morrer por uma infecção hospitalar do que pela própria doença. E quando vem para Barretos, o câncer está avançado. Nesse estágio, a doença arrebenta com a família, com o paciente e principalmente com o orçamento familiar.
Paulo Henrique: O que o senhor constatou na sua visita ao Hospital de Base e no interior do Estado?
Henrique Prata: Quando cheguei ao HB, no início de 2011, o governador havia decretado calamidade pública na saúde do Estado há uma semana. O que eu vi em Rondonia é uma coisa desumana. As pessoas operam de câncer e morrem de infecção. Essa é a realidade. É preciso que a sociedade levante uma bandeira e apoie esta iniciativa de se trazer a extensão de Barretos para Rondônia. Tem muita coisa que poderia ser feita no Estado e não se faz.
Agora eu entendo o motivo pelo qual os pacientes vêm para Barretos com ou sem passagens cedidas pelo Governo. A falta de estrutura e de diagnósticos preventivos justifica esta demanda em busca de saúde que obrigatoriamente deveria ser oferecida pelo Estado.
Paulo Henrique: O que pode ser feito para mudar este quadro?
Henrique Prata: Caso o Governador queira meu apoio para mudar este quadro lastimável, minha solução é enterrar tudo o que eu vi e fazer tudo novo. O tratamento de câncer em Rondônia está igual ou pior ao Haiti depois do terremoto que vítimou milhares de pessoas.
O governo atual herdou um abacaxi podre dos governos passados. Para onde foi o dinheiro do câncer? Deveria ser usado de forma correta. Há muitos anos não se faz investimentos na área oncológica do Hospital de Base. Acho que era conveniente dar passagens para a população se tratar fora, pois todos nós sabemos o alto custo deste tratamento e a demanda que é atendida na Fundação Pio XII.
Paulo Henrique: Fale sobre a parceria com o Governo de Rondônia em relação ao tratamento de câncer no Estado.
Henrique Prata: Minha ideia nesta parceria não era fazer uma gestão de câncer total, como seria um CACON (Centro de Alta Complexidade em Oncologia), nos moldes do que existe no município paulista. Fui a Rondônia levar conhecer as reais condiçoes dos pacientes e como era executado a prevenção e o tratamento de câncer no Estado. Nunca imaginei que precisaria trazer a extensão de Barretos para Rondônia. Mas o que eu vi é desumano. A rede pública não dispõe de aparelho de mamografia, ressonância magnética de alta precisão para diagnosticar o câncer, não há investimentos nesta aréa da medicina que está ceifando milhares de vidas.
Então resolvi criar, ainda neste semestre, a partir de abril de 2010, além do CACON na capital, um centro de diagnóstico e prevenção no interior do Estado, em fase de escolha na cidade de Ji-Paraná ou Cacoal. É claro que o apoio de toda a sociedade, incluindo a iniciativa privada, governo, parlamentares é fundamental para que se concretize este sonho.
Paulo Henrique: Caso haja possibilidade de se trazer a extensão de Barretos para Rondônia, onde será construído o Hospital?
Henrique Prata:Vou pedir ao governador, Confúcio Moura, a doação de um terreno de 20 mil² para se instalar um complexo hospitalar em Rondônia. Vou levar dinheiro
daqui, dos meus parceiros, que colaboram com o Hospital de Barretos. O local será o melhor possivel para atender a demanda.
Paulo Henrique: Há previsão para o início do tratamento de câncer para RO e demais estados da região norte?
Henrique Prata: O início das obras e do tratamento será em abril. Vou determinar a mudança do lugar dos serviços de oncologia do HB para outro lugar, apresentando ao governador o modelo de gestão que é implantado em Barretos. Nosso objetivo é diminuir a demanda de pacientes que saem da região Norte para se tratar na cidade paulista. Dos aproximados 3.000 atendimentos diários, 20% são de pacientes do Norte do país.
Paulo Henrique: Alguns de seus parceiros vão abraçar a causa em Rondônia? Qual o investimento inicial?
Henrique Prata: Sim. Estou levando comigo alguns de meus parceiros para RO, a exemplo do Instituto Ronald Macdonald e a Avon. Pretendo, além do Cacon e do centro diagnóstico no interior, criar uma casa de apoio em Porto Velho para atender toda região norte do País. Para o início de tratamento e realização de diagnóstico, vamos investir inicialmente R$ 5 milhões.
O que estamos discutindo agora é o custeio do tratamento entre o Governo do Estado e o Ministério da Saúde. Vale ressaltar que Rondônia gasta R$ 18 milhões por ano para que os pacientes de câncer façam os tratamentos em outras regiões do País. Imagine se este recurso fosse usado, de forma transparente, para melhorar o tratamento de câncer no Estado? De forma significativa o Estado seria, em pouco tempo, referência na região norte do País.
Por isso é fundamental o esforço dos diversos segmentos sociais e das autoridades políticas neste processo de mudança. Pretendo, de forma organizada, rastrear os índices de câncer na região norte do Brasil.
Paulo Henrique: É verdade que RO lidera o ranking de pacientes com câncer em Barretos?
Henrique Prata: Não pense que o câncer está somente em RO. Temos pacientes dos 26 Estados e do Distrito Federal. Em 2010, realizamos 484.269 atendimentos para 50.865 pacientes de todo o Brasil.
Acontece que, apesar da distância de 2.500 km entre Barretos e RO, o hospital paulista trata de mais de 90% de todos os pacientes com câncer no Estado. O povo é sabio, vem onde tem o melhor atendimento. Por isso os pacientes preferenciam Barretos, por termos um tratamento de primeiro mundo.
O maior pecado de RO e MT é mandar pacientes com câncer avançado. Caso o diagnóstico fosse realizado precocemente, digo com toda clareza, vidas seriam salvas.
Paulo Henrique: Como a Fundação Pio XII observa o trabalho da ASSDACO, Associação Assistencial a Saúde São Daniel Comboni, relativo ao hospital do câncer em Cacoal? Há possibilidade de parceria com esta associação?
Henrique Prata: Meu pai dizia que se eu conseguisse conciliar prevenção, assistencialismo e pesquisa, o mundo nos reconheceria como um centro sério. Foi no que deu. Em 2008, o hospital fundado pelo meu pai - o médico Paulo Prata - foi apontado pelo Instituto Nacional de Câncer, dos EUA, como referência para pesquisa na América Latina.
Assim eu me refiro ao trabalho desta associação. Parabenizo pelo empenho da comunidade e proponho-me a orientar, apresentar o modelo de gestão inserido na Fundação Pio XII. Estou indo a Cacoal neste mês de abril para conhecer as instalaçõe a convite da ASSDACO.
Aconselho que quem vai cuidar do tratamento do câncer deve cuidar de um todo. É preciso fazer começo, meio e fim. É impossível se ter duas empresas na mesma instituição. Caso contrário este processo nasce falido. O câncer tem um conceito multidisciplinar. “Gestão única”, senão é dar murro em ponta de faca.
Eu me comprometo a treinar equipe, repassar este modelo de gestão que obteve êxito. Minha estadia em Cacoal será de grande valia para visualizar o Estado e dar uma posição ao governador sobre a parceria com a Fundação Pio XII.
Paulo Henrique: Qual o príncipio que norteia os profissionais e os colaboradores da Fundação Pio XII?
Henrique Prata: O princípio soberano é o amor. Temos uma filosofia de um a dez. Se você der todo o seu amor, você tera uma vida integrada com a filosofia da instituiçao. Somos um projeto de fé. Todo mês faltam mais cinco milhões de reais. Estamos mais de 50 anos trabalhando em parceria com a comunidade. Este hospital é uma obra de amor que vive pelo amor.
Paulo Henrique: Isso foi repassado pelo seu pai, Dr. Paulo Prata, ao iniciar a Fundação Pio XII? Qual era sua filosofia de trabalho?
Henrique Prata: Sim. Meu pai nos ensinou esta filosofia de vida. Este pequeno Hospital contava com apenas quatro médicos: Dr. Paulo Prata, Dra. Scylla Duarte Prata, Dr. Miguel Aboriham Gonçalves e Dr. Domingos Boldrini. Eles trabalhavam em tempo integral, dedicação exclusiva, caixa único e tratamento personalizado, permitindo um tratamento eficiente aos pacientes. Esta filosofia de trabalho é que promoveu o crescimento da Instituição. Uma maneira que o hospital encontrou de homenagear as pessoas que contribuem com a causa do câncer é colocar seus nomes como identificação dos pavilhões.
Paulo Henrique: Considerações finais para as autoridades e a população de Rondônia.
Henrique Prata: Vamos acreditar neste sonho. Com união, perseverança e muita fé, todos os nossos sonhos se realizam. Vamos começar este sonho em Rondônia. Conto com apoio de todos vocês.
FICHA TÉCNICA
Hospital de Câncer de Barretos
Fundação: 1967
N.º atendimentos por dia: 3 mil
Municípios atendidos em 2010: 1.372
Déficit mensal: R$ 5,4 milhões
N.º de refeições diárias: 8 mil
N.º de alojamentos: 13 (com capacidade para 650 pessoas)
Pacientes atendidos em 2010: 50.865
N.º de funcionários:2,5 mil, sendo 250 médicos em tempo integral e dedicação exclusiva