Os limites da propaganda eleitoral vêm se estabelecendo com um relevante objetivo: garantir a igualdade dos candidatos na disputa. Em 2006 uma série de inovações foram fixadas neste sentido. A proibição dos outdoors, que antes era utilizado exaustivamente por aqueles que possuíam vultuosas posses, foi um dos destaques. Outra mudança foi a proibição de distribuição dos famosos brindes (bonés, camisetas, chaveiros, etc.), que em muitos casos representava vantagem ao eleitor, camuflando a compra do voto.
Repito, a vontade da norma foi sempre de proporcionar uma disputa igualitária, sem privilégio, combatendo o uso abusivo do poder econômico. A lei de 2006 ainda endureceu a proibição de uso do patrimônio público para fins de propaganda eleitoral. Antes era permitido utilizar os postes, viadutos e pontes com a fixação de faixas, placas e por aí vai. Isso acabou. Outra coisa que teve o seu fim a partir de 2006 foi a realização dos famosos showmícios. Os “endinheirados” investiam alto com artistas famosos e em contrapartida tinham os votos dos simpatizantes desses artistas.
Outra norma surgiu trazendo mudanças nas regras eleitorais. Foi a lei n. 12.034/2009. Entre as várias alterações, destacam-se as específicas sobre a garantida de uma saudável e paritária propaganda. A vedação ao uso de trios elétricos em campanhas eleitorais, exceto para a sonorização de comícios, foi uma dessas. Nem todos os candidatos têm condições de despender recursos para isso. O limite da propaganda em 4m² é outra regra agora positivada em lei e que a jurisprudência transportou para a adesivagem (ou plotagem) de veículos.
Muitos cidadãos estão a perguntar, onde ou como pode ser realizada propaganda eleitoral? Pois é, ao cidadão, pessoa do povo, aplica-se uma máxima no direito que diz que ?ao particular é permitido tudo que não é proibido?. Logo, como as proibições estão dispostas em várias legislações (leis, resoluções, etc.), a todos, principalmente o candidato que não possui condições financeiras suficientes para contratar uma consultoria jurídica para orientá-lo, aqui vai a dica: tudo que for feito com uso de privilégios, isto é, que não estar acessível a todos, é proibido.
Nesse raciocínio um caso está ensejando várias dúvidas. Estacionar um veículo num estacionamento de órgão público é conduta proibida? De pronto podemos afirmar que não. Em todo o arcabouço jurídico brasileiro não encontramos qualquer norma dispondo especificamente sobre isso. Tal dúvida, desde as últimas eleições tem chegado às barras do Poder Judiciário para decidir. A resposta tem sido única: trata-se do exercício do direito previsto na Constituição Federal da livre manifestação do pensamento (art. 5º, IV, CF/88), por isso permitido.
Vários Tribunais já decidiram a respeito, a exemplo do TRE-RN, Recurso Eleitoral n. 8914/2008, TRE-SP ? Recurso Eleitoral n. 29.827/2008 e TRE-MT, Recurso Eleitoral n. 909/2008). A conclusão em todos foi de que não há óbice para a adesivagem de carros com propaganda política, ainda que de propriedade de funcionário público, desde que respeitados os limites. O raciocínio é simples: se o carro é de particular e o estacionamento é de acesso público, ou seja, qualquer pessoa pode adentrar ao recinto e estacionar seu veículo (acessível a todos), desde que haja vaga, é óbvio, não resta configurado o privilégio com a utilização de bem público para fins de propaganda eleitoral. Por outro lado, se o veículo ficar estacionado num espaço do órgão público de maneira permanente (ex.: veículo particular não podendo circular em virtude de um problema mecânico há tempo) ou numa vaga privativa (ex.: chefe da repartição) é bem certo que estamos diante de condutas ilícitas, capazes de desequilibrar a disputa, que com certeza merecem uma ação por parte da Justiça Eleitoral no seu legítimo exercício do poder de polícia.
Haveria um rigor muito desarrazoado exigir que ninguém pudesse manifestar, individualmente, sua preferência eleitoral. Ora, na lei n. 9.504/97 consta, taxativamente, que é permitida a manifestação individualizada e silenciosa da preferência do eleitor por partido político, coligação ou candidato, revelada exclusivamente pelo uso de bandeiras, broches, dísticos e adesivos, inclusive no dia da eleição. A única exigência legal é que a adesivagem veicular esteja de acordo com os limites legais (4m2, nome do partido/coligação, etc.).
Vale ressaltar que se o estacionamento do órgão público for de uso restrito dos seus servidores, não há como admitir permanência de veículos com adesivo de propaganda eleitoral, pois neste caso prevalece a natureza eminentemente pública e restrita do estacionamento, o que causaria um desequilíbrio.
Caso admitíssemos essa proibição, poderíamos colocar em risco o bem-estar da sociedade, quiçá a vida e a segurança. Vejamos as aberrações: um servidor que costumeiramente estaciona seu veículo dentro do órgão público deveria agora estacioná-lo na rua, sujeitando o seu bem a ação de vândalos. Outro exemplo é de um veículo com propaganda eleitoral que leva um paciente para atendimento médico, devendo estacioná-lo fora do espaço público da unidade hospitalar sob o único argumento de evitar a utilização do bem público para fins eleitorais. Em resumo, não há razoabilidade e justa interpretação das normas e da vontade do legislador se assim fosse entendido.
Dessa forma, temos que tudo que leva ao desequilíbrio da disputa eleitoral é inadmissível no ordenamento jurídico brasileiro. No caso específico dos veículos em estacionamento público, se dar melhor o que chegar primeiro. Ninguém pode proibir o estacionamento de um veículo particular só porque é de uma agremiação ou candidato adversário. A liberdade de escolha deve prevalecer, afinal, é essa a mola propulsora da democracia.