ARTIGO - Michael Jackson Não Morreu - Por Antônio Serpa do Amaral Filho

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Foto: Divulgação

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Nova York está de luto. Porém, Michael Jackson não morreu. Elvis também não. Pelé é eterno, e o nome do Rei do Baião arde flamejante nas labaredas incandescente em homenagem a São João. Um ídolo não morre, eterniza-se na memória dos povos. O Rei do Pop moderno, aos 50 anos de idade, teve parada cardíaca, e isso lhe ceifou a vida biológica, mas não a vida mitológica. Mito que é mito não morre. A morte insinua ser apenas numa tentativa de desconstituição do ícone cultural. Porém vã. O ex-integrante do Jackson Five, com a ajuda de uma máquina publicitária capaz de transformar pau em pedra, pertence hoje à galeria dos ídolos pop imortalizados desde o século 20, como Jimi Hendrix, Janis Joplin, Bob Marley e Elvis Presley. Todos são figuras emblemáticas da moderna sociedade de consumo. Literalmente falando, nossos ídolos ainda são os mesmos e as aparências não enganam não.
 
Mais que a morte do homem, o mundo lamenta mesmo é sua orfandade mitológica. A coisificação engendrada na consciência do homem parido e criado nas megalópolis de cimento e aço tende a substituir o ser real do artista. Quando ele ainda era gente, o meu irmão, Miguel Amaral, hoje médico e cronner da Banda Los Dinos, o imitava, cantando o sucesso Ben, com agudos e falsetes que a difícil interpretação requeria. O menino pobre e negro transfigurou-se num personagem branco e rico. O exímio dançarino fez-se mito para si mesmo, antes que a mídia o fizesse para os Estados Unidos e para o mundo. É tal a magnitude do fenômeno que as lágrimas vertidas de todas as latitudes da terra são em pêsames ao mito que consumiu e abduziu o Michael Jackson de carne e osso, transportando-o literalmente para a Terra do Nunca, sua Never Land. Daí Porque, em prosa, diríamos: o mito é rito, fato, sonho, fantasia a mascarar o ego no desbunde do carnaval existencialista; na overdose sensitiva da subjetividade dança o mito, na ciranda da semiose tem seu berço semântico; na fragilidade do homem frente ao vendaval de significações, saboreia seu fast-food predileto, sua praia é a inquietude da consciência. O mito é sombra sorrateira forjada na alma para dar  sentido ao suspiro cotidiano de cada ser vivente. O mito é parente próximo, distante, é primo, pai, mãe, avô, dança do arquétipo ancestral, emergente da caverna paleolítica para a contemporaneidade, da necrorealidade dos tempos de matrix. O mito, anador das angústias humanas; mito, coador da borra do meu café mental. Nossos sonhos estão nele, nossa libido está nele, nele estão nossas esperanças, nosso vazio nele encontra tapume e argamassa. O mito é misto quente, devaneio tuti-frutti do eu boquiaberto frente ao mundo que o indaga e surpreende; com ele nos embriagamos no bar da esquina do tempo; a projeção da consciência para o mar aberto das versões concebe o mito; metade do mito sou eu, metade é ele, outra banda do mito somos nós, o meu e o teu não-eu soltos no ar como bolha de sabão encantando olhos incautos. O mito é pleura, é soda, é moda, foto três por quatro numa sala de espelhos a refletir as mil facetas da alegria, da angústia e carência humanas, planando em asas de fênix massificada. Por isso, por ser um rito, um mito, fito e capto, e tenho dito: Michael Jackson não morreu.
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