A trajetória ferroviária do Brasil expõe um paradoxo que molda até hoje a logística e a eficiência econômica do país. No início do século 20, as ferrovias eram o grande eixo de integração nacional. Linhas conectavam fazendas de café, cidades em expansão e portos estratégicos, acompanhando a dinâmica econômica da época. A malha crescia com rapidez e se consolidava como peça essencial do desenvolvimento brasileiro.
O cenário mudou drasticamente no pós-guerra. Com o plano de modernização de Juscelino Kubitschek e o forte incentivo à indústria automobilística, o país redirecionou sua prioridade para o modal rodoviário. Rodovias se multiplicaram, enquanto a rede ferroviária perdeu recursos, manutenção e relevância política. O resultado foi um processo acelerado de sucateamento: trilhos abandonados, ramais fechados e regiões inteiras obrigadas a depender quase exclusivamente das estradas.
Essa escolha deixou consequências profundas. Em um território continental, o Brasil passou a operar uma matriz de transporte desequilibrada, na qual a maior parte das cargas circula por caminhões. Esse modelo encarece o frete, desgasta as rodovias, gera gargalos logísticos e reduz a competitividade. Hoje, o país possui cerca de 30 mil quilômetros de ferrovias, número muito inferior ao de outras economias do G20 e concentrado principalmente no Sudeste. Enquanto Estados Unidos, China e Rússia expandiram suas redes com políticas robustas, o Brasil avançou lentamente, apoiando-se sobretudo em concessões e no capital privado.
Nos últimos anos, iniciativas de retomada do setor têm surgido, mas ainda enfrentam entraves regulatórios, burocráticos e financeiros. A reconstrução ferroviária vai além da infraestrutura: é uma decisão estratégica. Reequilibrar a matriz de transportes pode reduzir custos logísticos, aumentar a competitividade das exportações,
melhorar a mobilidade urbana e impulsionar o desenvolvimento regional. A história mostra que o caminho dos trilhos já foi sinônimo de progresso e pode voltar a ser.