Política em Três Tempos - por Paulo Queiroz

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Foto: Divulgação

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1 – CORRUPÇÃO – GÊNESE Não, minha senhora, a corrupção não vai acabar. Nunca? Não vai acabar nunca? Indagar-se-á vossa mercê absolutamente coberta razão - toda que lhe puder ser humanamente imputada. Nada obsta. Um espírito calejado com as iniqüidades deste mundo talvez emprestasse daquela velhinha do comercial de presunto da TV a resoluta convicção para lhe responder dessa forma: o quê? Se a corrupção vai acabar? Nem a pau, Juvenal! Crédulo por natureza, no entanto, daqueles que acreditam em tudo quanto lhe dizem – inclusive naquela antiqüíssima história segundo a qual a humanidade tem jeito -, o repórter ainda preserva a pia crença de que um dia a coisa possivelmente possa melhorar. Mas, decididamente, não enquanto perdurar esse sistema onde as pessoas são avaliadas não pelo que são, mas pelo que possuem. Quem o diz não é este ignaro digitador de espasmos eletrônicos, mas gente que se atormentou bastante em vida estudando este assunto. Como Thomas Morus, que por sinal é santo da Igreja Católica, padroeiro dos políticos e patrono dos advogados. Ele e mais uma montoeira de estudiosos chegaram mais ou menos a esta mesma conclusão: a corrupção começou quando o primeiro homem cercou o primeiro pedaço de terra e encontrou outro que acreditou quando ele disse isso aqui é meu. A isso Thomas Morus e seus colegas chamaram de propriedade privada, identificando nela a raiz de todos os desvios de conduta da espécie humana. Para muitos dos colegas de Morus, aliás, esse tipo de coisa não passa de um roubo. Mas se é roubo, porque não se pune? Aí é que está minha senhora. Quando o primeiro homem acreditou que o vizinho era o dono da terra que cercara estava estabelecido o primeiro contrato social, com aquele reconhecendo o direito deste sobre o terreno cercado. O homem que ficou sem terra não achou aquilo muito justo, mas por consentir no que o outro dizia conferiu àquela posse o aspecto legal. Como os dois homens eram iguais em tudo e um ficou sem terra, não era mesmo justo. Mas era legal. B<>2 – PÃO E CIRCO E foi assim que esse tipo de roubo deixou de sê-lo. De lá para cá, essa espécie de contrato sofisticou-se desmesuradamente, estabelecendo relações legais intrincadas que passaram a reger toda a atividade humana. Mas remonta a esses tempos imemoriais a fieira interminável de escândalos de toda sorte, tanto mais escabrosos quanto mais a humanidade ia se organizando em sociedades cada vez mais complexas, ricas e dissolutas. No Império Romano, por exemplo, era um horror. O modelo, no entanto, passou por muitas provações até se estabelecer como hoje se conhece. Como ele só funciona como uma pirâmide, onde os que estão no topo ficam com quase tudo e os que estão na base com quase nada, sempre que estes se davam contam de que estavam sendo, no frigir dos ovos, roubados eclodia um quebra pau, com cabeças rolando para tudo quanto é lado. Mas como os que estão no topo não chegaram lá por acaso, sempre se arranjava um jeito de esfriar os ânimos. Quando não era possível trucidar de vez os revoltados, dava-se um tempo para as coisas se acalmarem e começava tudo de novo. Mas logo se chegou à conclusão de que era preciso dar alguns anéis para não perder os dedos, quiçá as cabeças. Bastante espertos, os romanos inventaram o pão e circo para manter os da base distraídos. Daí até o crédito consignado para comprar a televisão e o bolsa-família para mitigar a fome dos que vivem abaixo da linha da miséria foi um estirão. Com altos e baixos, o pau andou quebrando adoidado por esse mundo velho sem porteira. Mas o que é que isso tem a ver com o mensalão, os sanguessugas e as incontáveis operações da Polícia Federal com nomes folgazões? Calma, minha senhora, já vamos tentar explicar. Lembra da pirâmide? Pois bem. Entre o topo e a base dela fica um pessoal chamado classe média. Todos tentando chegar no topo, porquanto em tese todos, inclusive os da base, podem chegar lá. É nesse nível é que ficam os funcionários públicos, no que nos interessa, aí incluídos juízes e parlamentares. 3 – VALORES CAPITAIS Mais do que ninguém, juízes e parlamentares sabem que o ordenamento jurídico existe para perenizar a legalidade do roubo dos que estão no topo. Enquanto estes regalam seus jantares com vinho de R$ 20 mil a garrafa, os salários daqueles não chegam a isso. Aí, danou-se! Vive-se numa sociedade onde a pressão do consumo é incomensurável. As mulheres dos juízes e parlamentares não lhes dão sossego. Mas são eles os responsáveis pela manutenção do sossego dos que debocham bebendo mais de um mês dos seus salários num fortuito jantar. Convenhamos, não é justo. Como não é mesmo, está encontrada a justificativa moral para avançar numa beirada. Não é legal, mas está no rumo do justo. Como observou o sociólogo Léo Lince em artigo recente sobre o tema, neste sentido, a declaração do ministro da Justiça, Tarso Genro, funciona como uma espécie de chave de decifração para o enigma que devora as instituições da nossa sereníssima República. Sempre cioso da precisão categorial – considera Lince -, ele propõe uma separação, não apenas para efeito de análise, entre os “atos delituosos” e os “maus hábitos políticos”. Aos primeiros recomenda a punição rigorosa, “doa a quem doer”, como avalizou o presidente Lula da Silva. Quanto aos segundos, contemporiza, porque sabe que sobre eles se constrói a governabilidade do sistema. Desse modo, a corrupção se desenrola a partir de um novelo que cumpre uma função primordial na reprodução do modelo dominante. Os “valores” que articulam o capitalismo financeiro e o sistema político que lhe fornece base de sustentação, segundo Lince, estão no caroço do novelo. O observador atento já está para lá de careca de saber. Em todos os escândalos, nos anteriores, nos que estão em curso e nos que virão, vige a mesma marca: a micro-política que sustenta a macroeconomia da exclusão. Para concluir com ligeira adaptação do repórter: em cima, a fortaleza inexpugnável da casta financeira. No meio, o intestino grosso da pequena política. Em baixo, o populacho, entretido com o circo destinado a fazer-lhe se render aos desejos e interesses dos demais.
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