O ambiente é desértico, quieto, ar seco e a poeira baixa, mas da entrada da Praça do Complexo da Estrada de Ferro Madeira Mamoré, no alto da escadaria que serve como portão de chegada, já é possível ver uma boa parte queimada e feia, e um pouco mais ao fundo o mato alto, parte seca mesclando com o verde, tomando conta dos velhos vagões encostados e abandonados ao lado do antigo galpão que um dia foi chamado de Cibec (Clube dos Civis do 5º BEC), que pertence a Marinha do Brasil em Rondônia.
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Entrada da praça do Complexo da Estrada de Ferro Madeira Mamoré. Feia, muito feia. |
Em tempos de estiagem e secura, com a baixa umidade no ar, tudo no entorno dos velhos vagões e duas antigas locomotivas vira combustível para ser tomada pelas chamas caso ocorra um sinistro de forma acidental. Uma fagulha, uma bituca de cigarro acessa, uma faísca e todo o mato e vagões podem ser consumidos em pouco espaço de tempo e levar junto parte da história da EFMM novamente.
A reportagem do Rondoniaovivo em contato com o museólogo Antônio Ocampo, esteve percorrendo o perímetro que representa perigo para os antigos vagões, tomados pelo mato, e onde entulhos de sedimentos que permaneceram ainda da cheia histórica do rio Madeira em 2014 guarnecem como morros tomando trilhos e duas antigas locomotivas que estão sumindo em meio a esse caos.
O semblante triste do museólogo ao caminhar e explicar como tudo foi esquecido pelo poder público municipal – não cabe mais ao Estado e nem ao Iphan, órgão federal fiscalizador do patrimônio histórico em todo Brasil, guardar ou preservar todo o entorno da EFMM tombado pelo patrimônio histórico e protegido por lei federal -, mas sim à Fundação Cultural de Porto Velho, Funcultural, que detém a responsabilidade cuidar, proteger, preservar e guarnecer todo o acervo, incluindo aí locomotivas, galpões, vagões, rotunda, peças, etc. Mas, a passos de tartaruga ou de forma quase inoperante, apenas paliativamente cuida do complexo.
DIVISÃO
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Velhos vagões tomados pelo mato podem virar 'combustível' para incêndio. |
É perceptível ver que a praça do complexo é dividida em duas partes, uma revigorada – a antiga estação da EFMM está sendo reformada e servirá para uso da Setur (Superintendência Estadual de Turismo/Rondônia), com a limpeza do espaço em volta, que inclui o deck de frente ao rio Madeira e mesmo o gramado da praça e entorno dos dois galpões próximos.
Porém do outro lado fica o antigo galpão da oficina – custeada e recuperada pelo Consórcio Santo Antônio Energia – que após reforma foi fechada, a rotunda e os velhos vagões e três esquecidas locomotivas, sendo que duas delas estão escondidas por trás do morro de sedimentos do rio que surgiram após a enchente histórica, e mato, muito mato, mato alto tomando boa parte do espaço, alguns já secos.
“Meu amigo isso aqui é um barril de pólvora. É lamentável que o poder público municipal não tenha ainda tomado as devidas providências para limpar toda essa área. Um acidente de sinistro aqui e perdemos de novo outro pedaço da história da EFMM. A impressão que eu tenho é que para as autoridades essa parte do complexo não integra o tombamento histórico e por isso esse esquecimento, o descaso. É complicado”, relatou Antônio Ocampo, não escondendo a decepção.
SEM MUSEU
Ainda em 2011, justo essa parte hoje esquecida e transformada parcialmente em um matagal, a própria Superintendência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) havia aprovado em comum acordo com prefeitura – na época ainda como Fundação Iaripuna – em transformar o galpão da oficina e rotunda como um museu de peças móveis e o centro de memória dos trabalhadores vitimados durante a construção da ferrovia.
Ficou só na intenção e no projeto. A recuperação desse galpão foi feita, mas hoje está fechado.
SEM SEGURANÇA
Para piorar ainda mais a situação, o local como um todo está entregue a marginália, com casos e ocorrências de assaltos, consumo e venda de entorpecentes e até mesmo tiroteio (como o ocorrido no início da semana envolvendo uma quadrilha de ladrões - veja AQUI), deixando o local insalubre para a intenção do turismo.
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Restos de roupas velhas, lixo e sedimentos dentro dos vagões, que hoje servem de esconderijos para usuários de drogas. |
Sem segurança e sem policiamento, o Complexo da EFMM carece de mais atenção e cuidados básicos para a proposta do resgate histórico que lhe é de direito.
“Me deixa penalizado saber que por detalhes simples que mesmo o Iphan, como órgão fiscalizador, poderia junto ao município exigir providências e fazer um serviço digno a que propõe. Mas é triste. Eu mesmo e pessoas comprometidas com a história e a importância da preservação desse capítulo único da história não só de Rondônia, mas da região Norte, que é a Estrada de Ferro Madeira Mamoré, estamos sempre denunciando, alertando e/ou avisando sobre as necessidades de conservar esse patrimônio, mas parece que não resolve, somos vozes solitárias”, lamentou o museólogo.
A reportagem do Rondoniaovivo tentou falar com a Funcultural através do telefone disponível, porém não obteve sucesso. O espaço está aberto para esclarecimentos.
O local ainda necessita de limpeza rigorosa e o mato continua alto em muitos pontos, a situação é crítica e assusta pequenos comerciantes que trabalham nos quiosques, historiadores e antigos trabalhadores da EFMM.