Abunã, o distrito que também parou
Foto: Divulgação
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Quem adentra o perímetro urbano da BR 364, no distrito de Ponta do Abunã, a 120 km de Porto Velho, logo tem a impressão de que tudo está parado ou caminhando para o caos. O trecho é quase deserto, alguns dos poucos estabelecimentos comerciais estão fechando as portas por falta de movimento, não há uma unidade policial no local, e a população é ameaçada por endemias e vive um momento de revolta.
A placa que informa o nome do distrito, localizada na entrada, situa-se numa linha divisória que tem de um lado o cemitério, e do outro uma mega construção de um frigorífico projetado para ser um dos mais modernos do país. No entanto, a obra foi interditada há 8 meses, e o local agora está tão deserto quanto o cemitério.
O restaurante da Dona Matildes totalmente vazio, em pleno horário de almoço, e com as cadeiras empilhadas em cima da mesa, dá sinais de que a situação econômica no distrito é crítica. “Hoje vendi só três marmitex, e é assim quase todo dia! Ninguém está tendo dinheiro nessa cidade!”, lamentou a comerciante, Matildes Fernandes.
...Mas, dona Matildes conta que nem sempre foi assim: “Eu morava em Rio Branco [AC], e há um ano e oitos meses vim para Abunã montar esse restaurante, por causa do frigorífico. Durante o ano que a obra estava indo em frente, a cidade tava viva. A gente via o pregresso. Eu chegava a vender 500 Reais por dia de refeição. Já agora, quando vendo 20 Reais é muito!”, relatou a senhora prevendo que “desse jeito eu vou ter que fechar o restaurante”.
O frigorífico que a Dona Matildes se refere é o Frigonosso, que teve obra iniciada em julho de 2007, e embargada em agosto de 2008 pelo Ministério Público Estadual e Federal, através de processo em tramitação na justiça. A alegação é que o empreendimento ocupa Área de Preservação Permanente – APP. Já os advogados de defesa argumentam que “as técnicas que serão implantadas no frigorífico visam diminuir o impacto ambiental dentro daquilo que a lei permite, além das medidas compensadoras sem causar prejuízos a fauna e flora”.
Desde o embargo da obra, a população de Abunã vem se manifestando revoltada. Uma faixa fixada num ponto comercial abandonado, avisa: “Justiça social seja feita: Queremos nossos empregos de volta!”. Nesta semana, professores, estudantes e desempregados se uniram e se reuniram em um dos galpões construídos na área do frigorífico.
“Estão tentando destruir as nossas esperanças! Mas, vamos lutar em nome de cada pai e mãe de família que precisam ter o emprego de volta!”, disse emocionada a professora, Nézia Bráz. ”Eu já tenho meu emprego, mas também sou pai de família, por isso entendo a dor desses pais que perderam o emprego”, apoiou o funcionário público, Raimundo Nonato.
Ana da Silva é uma das mulheres que perdeu o emprego. Na obra do frigorífico foi seu primeiro trabalho com carteira assinada aos 26 anos de idade. Ela estava morando em Nova Mamoré e se mudou para Abunã só para trabalhar na referida obra. Agora, Ana e o esposo estão desempregados, tendo dois filhos pequenos. “Eu não entendo porque eles falam tanto de dar emprego ao povo e faz isso com a agente! A gente tava tão feliz no emprego! Eu tinha mês que ganhava até 700 Reais! Agora estou vivendo de favor dos outros, e vai ser o jeito voltar para Mamoré, senão, vamos morrer de fome”, desabafou a mãe.
Para o comerciante, Lelio Ibañez, que administrou Abunã no período de 2005 a 2008, o empreendimento está associado a avanço sócio-econômico no distrito. “Quando o grupo de empresários me apresentou na época a proposta de realizar o projeto aqui em Abunã, logo vi que a população seria muito beneficiada. Durante o ano que seguia a construção do frigorífico, Abunã entrava num processo de desenvolvimento acelerado. As oportunidades de emprego se abriram para muitas famílias. Muita gente que tinha ido embora estava voltando. Mas, infelizmente, quando a obra parou, o distrito também parou”, declarou Ibañez.
“No momento que a Justiça embargou a obra, tive conhecimento de que 111 pessoas que estavam trabalhando com carteira assinada tiveram que ser demitidas, e muitas outras estavam em fase de contratação. Isso representou um abalo para muitas famílias. A estimativa é que cerca de 1200 empregos diretos e indiretos seriam gerados. E além de oportunidades de empregos, a população de Abunã também foi beneficiada pelos representantes do frigorífico com o aterramento do pátio do colégio que era foco de dengue e de malária, colocando em risco a vida das crianças. Eles também faziam pulverização na rua contra mosquito da dengue e da malária. Sem falar que até o Grupamento da Polícia Militar foi apoiado, já que os 11 policiais que faziam o patrulhamento no distrito fronterístico, ocupavam o alojamento do Frigonosso, antes de serem transferidos para Mutum Paraná”, finalizou Ibañez.
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