Citado com grande propriedade por Scorsese - Curva do Destino (Detour, 1945) dirigido por Edgar G. Ulmer, é um noir instigante, que acabou ganhando uma aura cult. O filme, inédito em vídeo, é lançado agora em dvd pela AURORA DVD. Saiba tudo sobre o filme.
*Foto/legenda:
*- O cartaz original do filme, com fotos, e no canto inferior à direita, em detalhe, uma foto do diretor Edgar G. Ulmer
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*Por: Humberto Oliveira¹
*Quando, em 1995, o cinema comemorava seus primeiros cem anos de existência, inúmeros programas reunindo as mais variadas tendências cinematográficas buscavam homenagear a chamada “sétima arte”, ora entrevistando atores, diretores, roteiristas, produtores, ora exibindo documentários sobre o tema.
*Muitos desses trabalhos tinham a pretensão de contar o que aconteceu nesses cem anos de existência do cinema a partir do ponto de vista de personalidades como Jean Luc Godar, o “infant terrible” da Nouvelle Vague francesa, Martin Scorsese, que além de ser um dos maiores cineastas em atividade é um extraordinário conhecedor de filmes. Outro destaque foi a compilação realizada pela Rede Globo – CEM ANOS LUZ – oito programas abordando temas e gêneros do cinema (fantasia, western, policial, terror, aventura, musicais, filmes brasileiros, etc.) com apresentação de Renato Machado e Fátima Bernardes.
*Entre os citados, um se destaca: UMA VIAGEM PESSOAL PELO CINEMA AMERICANO (1995), produzido, escrito e apresentado por Martin Scorsese, que dá uma aula de cinema nos três programas totalizando duzentos e dez minutos de duração. Os documentários foram exibidos pela Rede Bandeirantes com grande sucesso e lançados em vídeo pela Sagres em três volumes.
*Scorsese cita, enumera, mostra e analisa produções de vários gêneros como o musical (Rua 42), filme de gângster (Inimigo Público), western (Consciências Mortas), noir (Pacto de Sangue), terror (A Maldição do Sangue de Pantera), melodrama (Tudo que o céu permite), drama psicológico (Amar foi minha ruína), épicos do cinema mudo (Intolerância, Cabíria, Ben Hur, Os Dez Mandamentos, O Nascimento de uma nação), ficção científica (A mosca da cabeça branca, O dia em que a terra parou) e não esquece os filmes de referência que tem o cinema como pano de fundo (Assim estava escrito e Cidade dos Esquecidos). Cita diretores, que hoje estão esquecidos: Ida Lupino, Delmer Daves, Douglas Sirk, Robert Rossen, Edgar G. Ulmer, entre outros.
*Citado com grande propriedade por Scorsese - Curva do Destino (Detour, 1945) dirigido por Edgar G. Ulmer, é um noir instigante, que acabou ganhando uma aura cult. O filme, inédito em vídeo, é lançado agora em dvd pela AURORA DVD.
*Ulmer utiliza habilmente flashbaks e a narração em off para contar a história de CURVA DO DESTINO, isso sem falar na boa trilha jazzística, que pontua a trama que acompanha a trajetória sem sorte de um pianista de clubes noturnos, Al Roberts (Tom Neal), que ao aceitar carona de um homem chamado Haskell (Edmund Mac Donald), tem seu destino transformado tragicamente. Haskell morre acidentalmente e Al toma seu lugar, inclusive roupas, dinheiro e carro. Algum tempo depois, Al oferece carona para uma moça chamada Vera (Ann Savage), que também alterará o destino de Al Roberts. Depois de uma discussão, Vera acaba morta acidentalmente por Al, que não acredita no que está acontecendo.
*Curva do Destino foi o único filme destaque na carreira de Ann Savage, intérprete da femme fatalle Vera. Ela e Tom Neal atuariam juntos em mais cinco produções além de Curva do Destino – os inexpressivos Klondike Kate (1943) e The Unwritten Code (1944), que nunca foram exibidos no Brasil. O último filme de Anna Savage foi produzido em 1986 – Fire With Fire. A partir de então nunca mais atuaria em outro filme.
*Tom Neal durante a década de 40 atuou como “o cara durão” em filmes de baixíssimo orçamento de Hollywood. Em 1951 se envolveu numa briga com o ator francês Franchot Toned, os dois disputavam o amor de uma atriz, Bárbara Payton. Tom era lutador de boxe e Franchot saiu da briga com vários ossos do rosto quebrados, além de ter sofrido traumatismo craniano, em conseqüência, Tom foi banido dos estúdios passando a trabalhar como jardineiro e paisagista para sobreviver. Em 65, Tom se envolveria em outra situação violenta: foi acusado pelo assassinato da esposa. Tom acabou sendo condenado à morte, mas seus advogados conseguiram reverter à pena para dez anos de prisão. Tom seria solto em dezembro de 1971, mas morreria oito meses depois de ataque do coração. Assim Tom Neal entrou para história do cinema muito mais pela sua biografia do que pelos seus dotes de ator.
*O diretor Edgar G. Ulmer (1904 – 1972) foi desenhista de cenários para diretores teatrais como Max Reinhardt e Arthur Nikisch e nos anos vinte iniciou no cinema trabalhando para Alexander Korda. Quatro anos depois iniciou sua colaboração com F. W. Murnau, mestre do Expressionismo Alemão, diretor de clássicos do cinema mudo como Nosferatu (1909), A última gargalhada (1924), Tartuffo (1925) e Fausto (1926). Quando Murnau imigrou para os Estados Unidos, Ulmer o acompanhou e juntos realizaram Aurora (1927).
*Ulmer dirigiria seu primeiro filme em 1933, intitulado Damages lives. Dois filmes se destacam em sua carreira – Curva do Destino e Madrugada da Traição (The Naked Dawn, 1955). *No final de sua carreira foi forçado a ir para outros países à procura de trabalho. Filmou no México, Alemanha, Espanha e Itália e vários de seus filmes desse período se perderam no tempo.
*Edgar G. Ulmer faleceu em 1972 e realizou mais de cem filmes. É considerado por críticos e historiadores de cinema, um cineasta inovador devido a sua capacidade de ser criativo e rápido. Curva do Destino foi filmado em seis dias e com baixíssimo orçamento, mas isso não impediu que o filme constasse na lista do National Film Registry da Biblioteca do Congresso Americano, ao lado de filmes como E o vento levou, Casablanca, Ben Hur, Lawrence da Arábia, Pacto de Sangue, 2001 – Uma odisséia no espaço, O Poderoso Chefão e muitos outros.
*Ulmer é um diretor admirado por cineastas como Peter Bogdanovich, que o entrevistou para o livro “AFINAL, QUEM FAZ OS FILMES?”. François Truffaut em seu livro “OS FILMES DA MINHA VIDA”, também faz referência a Ulmer, dizendo que seus filmes são surpreendentes em frescor, sinceridade e inventividade. Truffaut afirma, com melancolia, que Ulmer é injustamente um dos mais desconhecidos cineastas americanos, mas que foi redescoberto nos anos 60 pelos críticos franceses.
*Outro grande cineasta que fala sobre Ulmer e de sua influência em seus filmes, é Martin Scorsese que em seu documentário “UMA VIAGEM PESSOAL PELO CINEMA AMERICANO”, de 1995, dá uma verdadeira aula de história do cinema ao analisar filmes e diretores de várias épocas, inclusive cita CURVA DO DESTINO, seu diretor Edgar G. Ulmer e sua contribuição para a história do cinema.
*¹HumbertOliveira é bacharel em jornalismo e cinemaníaco todas as horas