Tomado como um ponto de estratégia, a fortaleza Real Príncipe da Beira foi erguida no rio Guaporé, onde havia um canal que dava passagem a uma embarcação por vez. Os navegantes tinham que tomar cuidado quanto à correnteza daquele rio que de tão intensas lançavam as embarcações sobre as pedras, e durante a seca, o mesmo cuidado era dobrado devido à presença de rochas que ficavam visíveis ao redor da passagem demandando prudência do navegante.
Essa demora na passagem pelo rio acontecia no período de seca do Guaporé, fazendo com que os portugueses percebessem a presença do inimigo e, impedindo sua viagem.
Mediante experiência feita in loco em companhia do Exército brasileiro, medimos com precisão, com o auxílio de um aparelho de GPS a distância de uma das passagens estreitas do rio Guaporé a partir do baluarte de Santa Bárbara. Com 537 metros de distância do canal ao baluarte, Manoel Rodrigues Ferreira afirma que:
Os canhões do forte dificilmente poderiam atingir todas as embarcações, justamente por isso que foi escolhido este ponto do rio onde há uma pequena cachoeira, sendo todas as embarcações obrigadas a passar através de um estreito canal, sendo um único ponto do rio Guaporé onde há um canal obrigatório para a passagem das embarcações. (FERREIRA, 1961, p. 225)
Muito embora o local escolhido por Luiz de Albuquerque para a construção do Forte fosse possível dentro daquela conjuntura, críticas não faltaram ao seu empreendimento como as de João Severiano da Fonseca e Manuel Rodrigues Ferreira no século XIX que se divergem quanto à estratégia do local escolhido pelo governador da capitania de Mato Grosso.
O General João Severiano da Fonseca ao examinar o Forte durante sua expedição “Ao redor do Brasil” de 1875 a 1878 disparou críticas quanto à definição do local escolhido por Luís de Albuquerque para a construção do Real Forte e declarou que:
[...] Os terrenos fronteiriços são almargeais e brejões, impossíveis de serem habitados e transitados e, o leito do rio com sua dificuldade deixa uma canoa, como a que montamos vencer-lhe as pedras e corredeiras; e quando, enfim, não poderia esperar agressões nenhuma pela direita, terrenos brasileiros, encravados na mesma rede de vastos pantanais... Que D. Rolim de Moura fundasse o Fortim da Conceição compreende-se bem, era para defender a posição tomada dos castelhanos e firmar os direitos de posse da Coroa portuguesa; e também se compreende que mais tarde buscasse essa colina para o posto militar, visto aquele Fortim ficar sob as águas nas grandes enchentes do rio. Mas para tais fins, e para servir de guarda ao rio e defesa da navegação, um simples reduto bastava, naquele tempo que a artilharia ainda estava nas faixas da infância. O que não se compreende são os motivos que induziram Luiz de Albuquerque a erguer esta formidável fortificação num local, onde, quando mesmo sua existência não fosse completamente numa pela posição nada convinhável, seria desnecessária pela natureza do seu capo de ação”. (FONSECA. 1986. p. 217)
As observações do engenheiro Manuel Rodrigues Ferreira que esteve no Forte no século XIX, com experiência em construções e autor de diversas obras, entre elas Nas Selvas Amazônicas, contraria a opinião do General Severiano ao afirmar que a situação estratégica do Forte foi relevante para a coroa portuguesa e menciona que:
Por ter sido construído acima da confluência dos rios Mamoré e Guaporé, pois qualquer invasão por parte dos espanhóis só poderia efetuar-se descendo os rios Mamoré, Beni o Madre de Dios e subindo depois o rio Guaporé. Uma expedição fluvial, por outros lugares, espalhar-se-ia pela largura do rio e os canhões do Forte dificilmente poderiam atingir todas as embarcações, mas, nesse ponto do rio, onde há uma cachoeira, as embarcações são obrigadas a passar através de estreito canal. O alvo dos canhões do Forte seria aquele canal onde as embarcações teriam de passar uma após outra... Este é o único ponto do rio Guaporé onde há um canal obrigatório para passagem de embarcações. Por outro lado, na margem ocidental, numa extensão de milhares de quilômetros quadrados, há muito lagos, lagoas e terrenos alagadiços, formados pelos rios Baures, Intonamos e Mamoré, sendo impossível tentar-se uma invasão pela margem em frente ao Forte, e, pela retaguarda, devido à grandeza de seu poder, resistiriam por tempo prolongado qualquer cerco, dando tempo suficiente para receber reforço. (FERREIRA, 1961, p. 225).
Já para Gilberto Freyre, a engenharia que foi adotada por Luiz de Albuquerque para a construção de Vila Bela, se prestava à crítica de Pombal, de que:
Fizera à sua ciência a de desgarrar-se das possibilidades econômicas, dentro das quais o administrador sensato deveria traçar seus planos. O fidalgo da Ínsua sonhara edificar uma capital, para sua capitania, que fosse ao plano civil, o que o Forte da Beira, por ele construído, ficou, na realidade, no plano militar. Faltaram-lhe, por tanto recurso. A Vila Bela que conseguiu levantar foi pouco mais que projeto arrojado, tecnicamente admirável, de grandiosa cidade moderna no meio da selva tropical. (FREYRE, 1978, p.175)
Assim, com o surgimento em 1775 do Forte de Coimbra, de acordo com José Maria Nunes, portal de acesso ao sul, delimitaria no futuro, em associação com a monumental fortificação do Príncipe da Beira de 1776 (NUNES, 1985 p. 150), essa linha básica de defesa da fronteira ocidental, será fixada pelos portugueses no século XVIII.
Ainda segundo José Maria Nunes, a necessidade política decorrida da execução das fortalezas expressava o interesse da Coroa portuguesa em intensificar o
comércio e a navegação (NUNES, 1985 p.150), dessa maneira na Capitania do Grão-Pará e de Mato Grosso surgem os fortes que irão garantir o controle da fronteira impondo seu respeito e dando condições de navegação pelos rios que:
A companhia concessionária organizaria estabelecimento de apoio ao tráfico, em locais escolhidos e fiscalizados pelo capitão-general. Determinava-se a criação de “feitorias” na barra do rio Mequém e na região do fortim Nossa Senhora da Conceição. O fluxo comercial e regularidade da navegação ligavam-se à segurança da fronteira. (NUNES, 1985, p. 150)
Sem recurso para a construção do Forte, Luiz de Albuquerque enfrentou sem medo a censura de Pombal as empreitadas administrativas a que se lançara. Os gastos ultrapassavam os recursos da capitania. Obstinado, perseverou nos propósitos da coroa, cujo alcance seria mais tarde reconhecido, acreditando em seu alto significado político capaz de justificar os elevados sacrifícios que a todos sobreviriam.
Segundo José Maria de Souza Nunes, no quadro do memorável governo de Luiz de Albuquerque, entre as admiráveis realizações que se registra, sobreleva-se a obra maior da consolidação da fronteira ocidental, cujo marco mais expressivo é o Forte Príncipe da Beira (NUNES, 1985, p.161). Já para Gilberto Freyre, a fama de perdulário que parece ter sido ganho por Luiz de Albuquerque, junto a Pombal, nos primeiros dias de fidalgo da Casa de Ínsua no governo de Mato Grosso, não corresponderam fatos que a confirmassem (FREYRE, 1978, p.163).
Para Cruxen (2011), as fortalezas sempre foram utilizadas como marcas de presença para construção de um território, não servindo apenas como marcas de monumentalidade arquitetônica CRUXEN (2011, p.11), mas principalmente por sua grande expressividade retórica.
O conjunto de fortificações que foram implantados pela coroa para balizar as linhas divisórias procurou manter a segurança da colônia portuguesa na América do sul, sendo erguidos com esforços e resistências de seus principais colaboradores, o índio e o negro que foram mantidos como mão de obra forçada pela coroa. Para manter a consolidação do território da capitania de Mato Grosso no século XVIII, o Real Forte Príncipe da Beira, surge como marco de consolidação e ocupação permanente desse novo espaço que se anexava a coroa portuguesa, permanecendo como símbolo de uma conquista de um território que começou no século XVI.
O processo de construção das fortalezas iniciadas no século XVI teria sua consolidação no Oeste da Capitania de Mato Grosso no século XVIII, restando ao Real Forte Príncipe da Beira a função de proteger, guardar e manter a segurança do território conquistado pela coroa portuguesa.